PF na Secretaria Municipal de Saúde de Aracaju — Foto: Ascom/PF/DivulgaçãoA Polícia Federal realizou nesta terça-feira (7) a Operação Serôdio e cumpriu nove mandados de busca e apreensão em Aracaju e Nossa Senhora do Socorro para apurar desvio de verbas públicas, associação criminosa, corrupção, fraudes na licitação e na execução do contrato para montagem da estrutura do Hospital de Campanha de Aracaju. A investigação aponta indícios de que a empresa contratada foi favorecida.
Os mandados foram cumpridos na Secretaria Municipal de Saúde (SMS), na sede da empresa e nas casas de servidores públicos envolvidos na contratação.
A unidade hospitalar começou a funcionar no dia 21 de maio, atendendo pacientes com a Covid-19 em casos de baixa e média complexidade. O contrato investigado foi celebrado pela Secretaria de Saúde de Aracaju, por meio de dispensa de licitação, e é custeado com recursos da União, envolvendo o montante de R$ 3.258.000, repassados ao município para o enfrentamento à pandemia. A Controladoria-Geral da União (CGU/SE), que também participa da investigação, acrescentou que, até o mês de junho, Aracaju havia recebido pelo Fundo Nacional de Saúde, por meio do Fundo Municipal de Saúde, cerca de R$ 24 milhões para custar ações.
Durante a análise, foi identificado que a proposta vencedora continha as mesmas incorreções gramaticais de outras duas propostas. A PF informou que "é improvável que a mesma falha de redação tenha sido cometida por três redatores diferentes de três empresas diversas" e que isso pode mostrar combinação entre elas para apresentar os orçamentos.
A SMS informou, em nota, que ficou surpresa com a operação, pois disponibilizou a documentação solicitada e que informações podem ser acessadas pelo site Transparência Covid-19. A pasta ainda disse que o Ministério Público do Estado de Sergipe (MP-SE) arquivou procedimento semelhante ao não constatar qualquer indício de que houve a obtenção de informações privilegiadas ou situações de favorecimento [veja a nota completa abaixo]. A PF disse que não teve acesso aos laudos do MP-SE. O G1 também procurou a empresa responsável, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Os órgãos solicitaram cópia de todo o procedimento licitatório à secretaria e a documentação foi enviada, segundo a PF, após o terceiro pedido, e depois de Recomendação do Ministério Público Federal. Na documentação havia cópias de e-mails, orçamentos, propostas, termos de referência, justificativas e outros. Após análise, foram revelados indícios de favorecimento a determinado empresário.
A Polícia Federal ainda disse que, no procedimento licitatório foi desconsiderada a divisão do objeto licitado, que envolvia a locação de cobertura e estrutura completa, a climatização das coberturas e a locação de contêineres. Os serviços foram agrupados, impedindo que licitantes oferecessem propostas separadamente para cada item. E que essa decisão restringiu excessivamente a concorrência e elevou o custo da contratação.
Há ainda indícios de que a empresa contratada teria apresentado estrutura de climatização insuficiente para o ambiente a ser instalado e, mesmo assim, foi aprovada.
Ainda são investigadas outras contratações para o hospital, a exemplo das redes de gases, elétrica e hidro sanitária.
A PF também informou que um laudo pericial indicou a existência de sobre preço na locação da estrutura de climatização e na locação de contêineres. O documento também apontou que a estrutura para implantação do hospital não está sendo executada conforme previsto no termo de referência. Os peritos federais identificaram as seguintes divergências:
Utilização de piso de marca divergente daquela que foi especificada em termo de referência;
Inexistência de instalações elétricas, hidráulicas, sanitárias, de dados e voz, sendo que – no projeto básico – havia previsão dessas instalações;
O custo da locação de cada aparelho de ar condicionado por seis meses chega a quase três vezes o custo de sua aquisição;
Pé-direito mínimo inferior ao previsto em projeto básico.
Covid-19 em Sergipe
O estado tem mais de 30,7 mil casos confirmados do novo coronavírus e 826 vítimas. A capital tem mais de 17,3 mil casos e 356 pessoas mortas pela doença.
Até o último boletim epidemiológico divulgado pela Secretaria de Estado da Saúde (SES), o ocupação de unidades de terapia intensiva (UTIs) na rede pública era de 80,9% e na particular, ultrapassava os 118% - neste caso, pacientes excedentes vão para leitos de contingenciamento abertos pelos próprios hospitais em leitos que antes não eram destinados à Covid-19.
O que diz a SMS?
A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) informa que a gestão foi surpreendida com a Operação Serôdio, na manhã desta terça-feira (07), que apura fraudes na licitação e na execução do contrato para montagem da estrutura necessária ao funcionamento do Hospital de Campanha (HCamp) Cleovansóstenes Pereira Aguiar, haja vista que toda documentação solicitada pela Controlaria Geral da União e pelo Ministério Público Federal foi enviada pela SMS, contendo cópias de e-mails, orçamentos, propostas, termos de referência e justificativas.
A SMS reitera o compromisso com o bem público e com a assistência à saúde da população, principalmente, neste momento de pandemia, e reafirma que sempre esteve disponível a esclarecimentos dos órgãos reguladores, em nenhum momento, se opondo a apresentar dados, como comprova o site “Transparência Covid-19: informações sobre o combate ao coronavírus”, criado para reforçar as ações de transparência e que passa a integrar o Portal da Trânsparência do Município, a partir do qual a população tem fácil acesso a todos os dados referentes às ações de enfrentamento ao coronavírus adotadas pela administração municipal.
Um dos pontos apontados pela Controladoria Geral da União é o indício de combinação entre as empresas para apresentar seus orçamentos. A SMS lembra que o Ministério Público Estadual arquivou procedimento semelhante ao não constatar qualquer indício de que houve a obtenção de informações privilegiadas ou situações de favorecimento.
Além disso, a gestão explica que a Dispensa de Licitação nº 028/2020, por se tratar de um serviço eventual e emergente à covid-19, está amparada na Lei nº 13.979/2020, que autoriza a suspensão dos procedimentos licitatórios enquanto perdurar a emergência de saúde pública. Antes de pôr em prática a licitação dispensada, a Secretaria da Saúde de Aracaju solicitou orçamentos e obteve o retorno de propostas de empresas, com as quais chegou à média/mensal de R$849.074,33 para montagem da estrutura, valor 36% maior que o apresentado pela empresa vencedora. Venceu a disputa a empresa José Teófilo de Santana Neto Produções e Eventos, que apresentou proposta no valor de R$543.000,00/mês.
O contrato é por um período de até 180 dias (seis meses), e a estrutura pode ser desmontada antes desse período. As empresas participantes da licitação e as respectivas propostas apresentadas foram José Teófilo de Santana Neto Produções e Eventos – R$543.000,00; E3 Stands Projetos e Montagens – R$847.677,56; Rosa Déda Locação de Equipamentos e Serviços LTDA. – R$854.741,00;Destak Produções Eventos e Estruturas – R$875.200,00. As propostas foram protocoladas na Secretaria e os envelopes abertos em sessão pública também realizada na Secretaria.
Os esforços da Secretaria Municipal de Saúde de Aracaju no combate à pandemia causada pelo novo coronavírus são de conhecimento público. Há pouco mais de um mês, foi inaugurado o Hospital de Campanha Cleovansóstenes Pereira Aguiar, com capacidade para 152 leitos. No boletim atualizado na tarde desta segunda, 06, do total de pacientes que deram entrada no hospital provisório, 45 ainda estão internados; 22 foram encaminhados para Unidades de Tratamento Intensivo (UTI) e 16 foram a óbito. A unidade foi responsável pela recuperação de 152 dos 235 aracajuanos que necessitaram de internamento por conta da doença.
O Hospital de Campanha Cleovansóstenes Pereira Aguiar tem um valor mensal de R$ 3,2 milhões. Entre esses serviços, está a montagem do HCamp, medicamentos, EPIs (com estimativa de investimento de R$ 419.087,50), gerador, rede de gases, água, energia, videomonitoramento, laboratório, radiologia, esterilização de material, lavanderia, combustível, limpeza. O custo mensal do hospital com serviços e pessoal é de R$ 5.013.407,05.
A SMS mantém seu compromisso com a transparência e lisura no processo realizado, com a proteção da vida humana ao fazer todo esforço para garantir assistência médica adequada à população".
Denúncias
A CGU informou que, quem tiver informações sobre esta operação ou sobre quaisquer outras irregularidades, pode fazer uma denúncia anônima por meio de formulário eletrônico no canal Fala.BR.
Por G1 SE