Com quase oito meses de governo, que parecem muito mais pela intensidade e quantidade de polêmicas, o presidente inspira sentimentos ambíguos na população. Há um Jair Bolsonaro apoiado pela maioria, que ostenta índices positivos de avaliação, a ponto de se colocar em condições de sonhar com a reeleição, e que consegue alimentar no eleitor uma expectativa de desfecho positivo para sua administração, a despeito de problemas graves que persistem no país, como o desemprego. Mas uma parte de Bolsonaro é reprovada com força pelos brasileiros — até entre os que o apoiam. Curiosamente, é a porção polêmica da personalidade do capitão, a mesma que o ajudou a chegar ao poder como o único capaz de “peitar” o PT e o establishment político.
Funcionou na campanha, mas não repete o sucesso agora. As pessoas não estão satisfeitas com o estilo Bolsonaro de governar, com sua insistência em impor algumas pautas controversas como a flexibilização da posse e do porte de armas e, principalmente, com as declarações bizarras em série que se habituou a disparar no Palácio do Planalto.
Essas facetas de Bolsonaro aparecem com clareza em um levantamento encomendado por VEJA ao Instituto FSB Pesquisa sobre a avaliação da gestão, dos principais pontos de sua agenda e do desempenho do presidente. Feito por telefone com 2 mil pessoas em todo o país entre os dias 16 e 18 deste mês, o levantamento mostra que Bolsonaro continua bem na foto junto ao eleitorado.
Na pesquisa, 37% o apontaram como a liderança que serve de referência no avanço do Brasil ao responder à pergunta “quem está fazendo mais pelo país hoje?”. A avaliação do governo é positiva para 30%, e 45% acreditam que Bolsonaro encerrará bem o mandato. “Temos apenas oito meses de governo. As pessoas ainda não estão julgando resultados, mas as expectativas”, diz o analista político Alon Feuerwerker, coordenador da pesquisa.
Por outro lado, o levantamento revela que, mesmo neste começo, 48% dos brasileiros desaprovam a forma como Bolsonaro governa — contra 44% que lhe conferem respaldo. E outros 68% acreditam que as falas do presidente prejudicam em algum grau o andamento do governo — para 49%, elas atrapalham muito.
Nenhum eleitor de Bolsonaro pode dizer que se surpreendeu com a saraivada de declarações desastradas que o presidente vem distribuindo nas últimas semanas sobre temas variados. Afinal, o ex-deputado do baixo clero ficou famoso justamente por, entre outras frases polêmicas, chamar o torturador da ditadura Brilhante Ustra de “herói nacional”. Havia, porém, a esperança de que, uma vez no cargo, ele reduzisse o tom. Não é o que vem acontecendo.
Ainda sem mostrar consciência do tamanho da cadeira presidencial, Bolsonaro dispara os impropérios que lhe vêm à cabeça, da defesa extremada do filho Eduardo para embaixador nos Estados Unidos à afirmação, sem provas, de que ONGs e governadores promovem queimadas na Amazônia para prejudicá-lo. Nesta semana, ele divulgou um vídeo de caça às baleias para desdenhar da preocupação ambiental da Noruega, que suspendeu o repasse de dinheiro para um fundo de preservação da Floresta Amazônica — as filmagens, porém, ocorreram na Dinamarca.
Paradoxo
Como se vê na pesquisa, o comportamento irrefreável do mandatário, repleto de ofensas, fake news e temas já superados na cena política brasileira, vem chamuscando sua imagem. Ao mesmo tempo, o levantamento revela que a maioria ainda confia em sua liderança e capacidade de fazer uma boa gestão. O que explica esse paradoxo? Por ora, o pouco tempo de duração do governo e o rescaldo dos antagonismos da campanha de 2018.
Por Revista Veja