Em novas conversas vazadas pelo site The Intercept Brasil, divulgadas na madrugada deste sábado (29), dois procuradores do Ministério Público Federal (MPF) trocam mensagens e criticam as práticas do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, quando atuava como juiz. Os procuradores aparentavam preocupação com a entrada de Moro na política e a credibilidade da Lava Jato, ressaltando as supostas violações éticas do juiz.
Em conversas sobre a eleição presidencial, integrantes do MPF criticaram inclusive o fato de Rosângela Moro, mulher do ex-juiz, ter comemorado a eleição de Bolsonaro em suas redes sociais.
"Esposa de Moro comemorando a vitória de Bolso nas redes", diz o procurador Alan Mansur logo após a eleição. "Erro crasso", responde José Robalinho Cavalcanti, ex-presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República. "Moro já cumprimentou o eleito. Como perde a chance de ficar de boa, pqp", afirma a procuradora Janice Agostinho Barreto Ascari. "Esse povo do interior é muito simplório", ironiza o procurador Luiz Fernando Lessa.
Para Janice, "Moro se perde na vaidade". Procurador regional da 4ª Região, João Carlos de Carvalho Rocha concorda e vai mais longe: "Ele se perdeu e pode levar a Lava Jato junto. Com essa adesão ao governo eleito toda a operação fica com cara de 'República do Galeão', uma das primeiras erupções do moralismo redentorista na política brasileira e que plantou as sementes para o que veio dez anos depois", afirma, em referência a um aparato militar montado pela Aeronáutica na Base Aérea do Galeão, em 1954, para interrogar suspeitos do atentado contra Carlos Lacerda na rua Tonelero, episódio considerado um dos estopins para o suicídio de Getúlio Vargas. Dez anos depois ocorreu o golpe militar.
Segundo o Intercept, as conversas mostram que até mesmo Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, demonstrou preocupação com a adesão de Moro ao governo Bolsonaro.
"...temos uma preocupação sobre alegações de parcialidade que virão. Não acredito que tenham fundamento, mas tenho medo do corpo que isso possa tomar na opinião pública", afirmou.
Alvo de críticas de Moro por seu desempenho em interrogatórios, a procuradora Laura Tessler também foi contra a decisão do ex-juiz.
"...além de ele não ter poder para fazer mudanças positivas, vai queimar a LJ (Lava Jato). Já tem gente falando que isso mostraria a parcialidade dele ao julgar o PT. E o discurso vai pegar. Péssimo. E Bozo é muito mal visto"...se juntar a ele vai queimar o Moro", disse.
Antônio Carlos Welter, integrante da Lava Jato, chega a dizer que a postura de Moro poderia ser considerada "incompatível com a de juiz" caso ele fosse para o governo.
Após Moro aceitar o convite para o ministério, as mensagens mostram críticas à atuação dele como juiz. Ângelo Augusto Costa, procurador do MPF em São José dos Campos, afirma em um grupo que não confia em Moro.
"Em breve vamos receber cota de delegado mandando acrescentar fatos à denúncia. E, se não cumprirmos, o próprio juiz resolve. Rs", comenta.
Em conversa no dia 1º de novembro, através do aplicativo de mensagens instantaneas Telegram, uma hora antes de Moro aceitar convite para se tornar ministro do governo Bolsonaro, Monique Cheker, procuradora do MPF do Rio de Janeiro, escreveu em um grupo chamado BD a seguinte mensagem: "Moro viola sempre o sistema acusatório e é tolerado por seus resultados".
Um dia antes do anúncio oficial do cargo de Moro, a procuradora Jerusa Viercili, da força-tarefa em Curitiba, escreveu: "Acho péssimo. Só dá ênfase às alegações de parcialidade e partidarismo". Já Laura Tessler, também procuradora da força-tarefa, concordou com Viercilli e disse que achava melhor Moro não aceitar o cargo. "Também acho péssimo. Ministério da Justiça nem pensar. Além de ele não ter poder para fazer mudanças positivas, vai queimar a Lava Jato. Já tem gente falando que isso mostraria a parcialidade dele ao julgar o PT. E o discurso vai pegar. Péssimo. E 'Bozo' é muito malvisto? Se juntar a ele vai queimar o Moro", escreveu.
Após a confirmação do cargo de Moro no governo, Cheker voltou a questionar. "Diferente se fosse ao STF direto. Seria perfeito. Políticos precisam obedecer a prazos de 'desincompatibilidade'. Por que não os juízes e membros do Ministério Público? O distanciamento é importante numa república. Não basta ser honesto, tem que parecer honesto. Enfim", escreveu. "E a 'escadinha' disso tudo foi terrível: Moro ajudou a derrubar a esquerda, sua esposa fez propaganda para Bolsonaro e ele agora assume um cargo político. Não podemos olhar isso e achar natural", completou Cheker.
Outro lado Segundo o Intercept, o porta-voz da Lava Jato rebateu as novas revelações afirmando que as conversas podem não ser autênticas.
"O trecho do material enviado à Força-Tarefa não permite constatar o contexto e a veracidade do conteúdo. Autoridades públicas foram alvo de ataque hacker criminoso, o que torna impossível aferir se houve edições no material alegadamente obtido. A Lava Jato é sustentada com base em provas robustas e em denúncias consistentes, analisadas e validadas por diferentes instâncias do Judiciário. Os integrantes da Força-Tarefa pautam suas ações pessoais e profissionais pela ética e pela legalidade", diz a resposta.
Também de acordo com o Intercept, a procuradora Monique Cheker disse não ter registro da mensagem enviada e, portanto, não reconhece a suposta manifestação.
O procurador regional Luiz Fernando Lessa disse que não possui mais o aplicativo Telegram nem as mensagens trocadas por meio dele e por isso não reconhece as conversas.
Os demais procuradores foram procurados pelo site e não responderam até agora.
Por: Folha Press