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Chico José, em entrevista ao Blog de Assis Ramalho(Arquivo) |
Dos 40 anos da Globo Nordeste, o repórter Francisco José esteve presente em 36. Como único repórter de vídeo no Nordeste na maior emissora do país, ele tinha que mostrar a imagem da região, mas nos primeiros anos só conseguia mostrar miséria. "Era uma imagem real. Eu senti a minha responsabilidade e cheguei a pensar ‘será que eu vou ser o mensageiro da miséria a vida toda?’”, se pergunta. Na semana dos 40 anos da Globo Nordeste - que serão comemorados no próximo domingo (22) - estão sendo exibidas reportagens especiais para comemorar a data com histórias que continuam atuais, fatos e personalidades inesquecíveis. Chico conta, no NETV 1ª Edição, alguns momentos marcantes que viveu na emissora.
Há vinte anos, o repórter conseguiu tirar o foco exclusivo das misérias e se propôs a mostrar as belezas da região. “Comecei com Fernando de Noronha, com dezenas de reportagens. Vale do Catimbau, onde tem um lugar bonito no Nordeste, como Atol das Rocas, as praias, eu fui mostrar para o Brasil que essa região é uma região maravilhosa”, diz, orgulhoso.
O jornalista não esquece o primeiro dia de trabalho, quando foi pego de surpresa e colocado para narrar o jogo entre Santa Cruz e São Paulo, no estádio do Morumbi. “Eu nunca tinha narrado um jogo, eu não sei narrar. Ainda bem que foi 0x0. Teve uma bola na trave, se fosse gol, eu não saberia gritar gol. Eu só sabia que era para falar quando acendia a luzinha vermelha ‘no ar’. Depois, saí da cabine suado, de medo e de tensão”, relembra.
Apesar de achar que esse seria seu primeiro e último dia, Chico acabou se deparando com a profissão que levaria para o resto da vida. “Fui insistindo, indo dia a dia e hoje vivi muitos dos 40 anos que a Rede Globo está completando agora”, afirma o jornalista, que nasceu no Ceará, mas se considera pernambucano de coração, tendo denunciado os problemas graves do Nordeste e também suas belezas. A evolução da tecnologia no fazer telejornalismo foi uma das coisas que o repórter pode acompanhar, começando com a película, em preto e branco, e chegando até as mais modernas câmeras digitais. “Hoje, essas câmeras mostram tudo, até as nossas rugas e imperfeições”, diz.
Referência no jornalismo da televisão brasileira, Chico José presenciou a volta da democracia. “Miguel Arraes, a volta dele foi um dos momentos que mais marcou a minha vida profissional, porque ele chegou no aeroclube em um avião pequeno, acenando. Aquilo ali me marcou porque era a volta da democracia”, conta o repórter. Durante a ditadura, o repórter teve de driblar desafios como falar da seca do Sertão, mas sem usar a palavra fome, que era proibida. “Naquela época não comiam o mesmo que comem. Eu consegui mostrar sem dizer a palavra fome, mas aquelas pessoas precisavam de ajuda lá onde elas estavam”, diz Chico, que teve como momento marcante quando uma senhora correu atrás do carro da TV em uma estrada do Sertão e os levou até a sua casa. “Ela parecia um boneco de Vitalino, cheia de poeira e suada”.
As tragédias da seca marcaram o repórter, que viu diversas crianças, que não chegavam a completar um ano por desnutrição, serem enterradas em valas simples na área rural, apenas com uma cruzinha em cima, sem identificação. Eram os anjinhos da seca. “Cenas como essa nos chocavam muito, a seca matava muita gente”, diz.
O pacto de Luiz Gonzaga
Porém, nem tudo foi tragédia em todos esses anos. Chico José teve a oportunidade de conviver e viajar com o Rei do Baião, Luiz Gonzaga, que estaria completando 100 anos neste ano. “O fato mais marcante de nossa relação foi no dia em que ele me chamou para fazer a reunião da paz em Exu [Sertão de Pernambuco, onde Gonzaga nasceu]. Duas famílias viviam em guerra, eram dezenas de mortos. E ele convidou Dom Avelar Brandão, bispo de Salvador, mas que já tinha sido vigário em Exu e era um líder espiritual”, lembra.
Porém, o líder de uma das famílias não compareceu à reunião. “Luiz Gonzaga virou para mim e disse ‘Chico, vamos buscá-lo na fazenda’. Ele entrou no carro da Globo, nós entramos na fazenda, muita gente armada. E ele convenceu o líder a vir participar dessa reunião. A partir daí, não houve mais essa guerra no Sertão”, conta orgulhoso, lembrando que as desavenças entre as famílias, agora, são resolvidas em jogos de sinuca.
Um dos ícones religiosos no estado foi Frei Damião e o repórter teve a oportunidade de gravar com o frei várias vezes. Porém, entrevistá-lo não era tão simples. “Frei Damião falava muito baixo e a gente ia para as romarias, era complicado”, relembra.
Aventuras
A localização da Camacoa, uma corveta da Marinha perdida durante a guerra, e estava perdida há décadas no mar, foi outro marco da carreira do repórter. “Nem a Marinha sabia onde ela estava. Através de um pescador, conseguimos chegar até ela e gravar as primeiras imagens. Ela está a quase 70 metros de profundidade e mais de 30 quilômetros da costa”, explica Chico. A identificação foi feita em uma base no Rio de Janeiro, depois que as imagens subaquáticas foram exibidas.
Porém, as aventuras tiveram também seus momentos perigosos. “Medo a gente sente muitas vezes. O momento difícil que eu passei foi quando eu caí de um rapel, descendo por uma corda um penhasco de 120 metros. Eu bati com a cabeça na pedra e continuei descendo, mas eu sentia que o sangue estava descendo por dentro da roupa. Eu tinha medo de desmaiar ali. Se desmaiasse, ia ser difícil até resgatar o corpo”, lembra Chico.
Opinião do Blog de Assis Ramalho:
Francisco José, é um patrimônio do jornalismo Brasileiro, e orgulho do povo pernambucano. Aliás, durante toda sua brilhante carreira, dentro da poderosa Rede Globo, sempre fez questão de destacar o nosso Estado. A sua tragetória no jornalismo Brasileiro, por si já diz tudo. Em recente entrevista para esse Blogueiro, ele deixou registrado aqui neste blog a sua historia dentro do jornalismo, e acima de tudo a sua humildade, coisa que falta muito a maioria dos seres humanos no mundo de hoje. Valeu Chico José. Pernambuco e o Brasil se orgulha de você.