Foto: Assis Ramalho
Na Sexta-Feira Santa, revivemos o mistério da paixão, crucificação e morte de Jesus. Este é o único dia do ano em que a Igreja Católica não celebra a Eucaristia nem os demais sacramentos, com exceção da Penitência e da Unção dos Enfermos. O ato litúrgico mais significativo deste dia é a Celebração da Paixão do Senhor, às 15 horas, que se compõe de três partes: a liturgia da Palavra, a adoração da Cruz e a Sagrada Comunhão. A espiritualidade cristã inclui também a celebração da Via-Sacra, a recitação do Ofício da Paixão, a procissão do Senhor Morto e outras práticas de piedade ligadas às tradições locais. É muito importante também santificar esse dia com jejum e penitência e, no silêncio e na oração, contemplar o mistério da Paixão do Senhor.
A Sexta-Feira da Paixão direciona nosso olhar para a Cruz do Senhor, expressão do amor de Deus por nós, marco de uma nova aliança entre Ele e a humanidade, selada pelo sacrifício redentor de seu Filho. A cruz não apenas simboliza a humanidade de Deus, que assumiu as dores e tragédias humanas para nos salvar do pecado, mas também nos convoca à solidariedade e à transformação pessoal, unindo nossos sofrimentos aos de Cristo para alcançar a redenção.
A morte de Cristo na cruz nos faz lembrar dos sofrimentos e males que afligem o ser humano em todos os tempos: o peso esmagador da morte, o ódio e a violência que ainda hoje ensanguentam a terra. Embora a Sexta-Feira Santa seja um dia repleto de tristeza, é também uma oportunidade propícia para despertar nossa fé, fortalecer nossa esperança e coragem a fim de carregar nossa cruz com humildade, confiando em Deus e em sua vitória.
A morte de Cristo nos interpela profundamente. Quando foi preso, Ele poderia ter resistido com uma legião de anjos, mas escolheu não reagir por meio da violência, recusando-se a usá-la como meio de defesa. Na noite após a celebração da última ceia, traído por Judas, o Senhor foi levado à prisão. Na mesma noite, foi julgado pelo Sinédrio. Na manhã de sexta-feira, o Sinédrio o submeteu a um novo julgamento, acusando-o de blasfêmia. Por fim, foi condenado à morte, pois o Senhor não pôde negar que realmente é o Filho de Deus.
Após ser condenado pelo Sinédrio, que não tinha autoridade para executar penas de morte, Jesus foi levado a Pôncio Pilatos pelos líderes judeus, os quais solicitaram sua execução. Pilatos, não encontrando culpa em Jesus, propôs torturá-lo e, em seguida, conceder-lhe o indulto de Páscoa e libertá-lo. No entanto, eles rejeitaram a proposta e influenciaram a multidão a pedir a liberdade para Barrabás e a pena de morte para Jesus. Pilatos, renunciando à sua responsabilidade, “lava as mãos” e cede à pressão popular, condenando Jesus à morte, apesar de sua inocência. Esse fato nos faz refletir sobre como a justiça pode ser distorcida pela pressão da opinião de uma massa manipulada e, movida pelo espetáculo, transformar-se em vingança, condenando alguém à morte sem dar-lhe a ampla possibilidade de defesa.
A morte de Cristo na cruz é um grande mistério, difícil de compreender. Jesus, embora sendo Deus, optou por não usar suas prerrogativas divinas e seu poder. Ao contrário, “despojou-se de si mesmo”, assumindo radicalmente, exceto o pecado, a frágil condição humana até o extremo da morte humilhante numa cruz (Fl 2, 6-11). Essa escolha não foi um acidente, mas uma decisão deliberada de seguir o plano salvífico de Deus Pai.
São Paulo interpreta esse acontecimento à luz da fé. À arrogância e desobediência de Adão, ele contrapõe a humildade e obediência de Jesus. Embora sendo Deus e sem pecado, ao tornar-se homem, assumiu nossas debilidades, fez penitência em nosso lugar, carregando sobre seus ombros nossos pecados. Submeteu-se a tudo por amor a nós, até a morte humilhante na cruz. Por amor, “despojou-se de si mesmo” e tornou-se nosso irmão, compartilhando nossa condição humana. Por sua obediência, Deus o exaltou à sua direita, para que, “ao nome de Jesus, todo joelho se dobre no céu, na terra e debaixo da terra, e toda língua proclame: ‘Jesus Cristo é o Senhor’, para a glória de Deus Pai” (Fl 2, 10-11).
Reviver o mistério da Paixão de Cristo significa também buscar significado para os acontecimentos dolorosos de nossa história pessoal e coletiva. Por isso, devemos ter em mente, neste dia da Paixão do Senhor, as situações dramáticas que afligem tantos irmãos nossos no Brasil e em todas as partes do mundo, mostrando solidariedade e empatia com os sofredores e vítimas da maldade humana, da injustiça e da violência.
CNBB
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