terça-feira, dezembro 05, 2023

Doenças de moradores de áreas impactadas por torres eólicas são relatadas em audiência pública na Alepe

Fotos: Nando Chiappetta/Alepe

A falta de uma regulamentação com normas para a instalação de usinas eólicas foi um dos pontos apontados em Audiência Pública realizada pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Pernambuco-Alepe, nessa segunda-feira (04). No encontro, foram apresentados relatos e estudos comprovando o adoecimento de pessoas que moram perto das torres, além de impactos socioambientais.

Professora e pesquisadora da Universidade de Pernambuco, Wanessa da Silva apresentou estudo sobre os efeitos dos infrassons e ruídos audíveis emitidos pelos aerogeradores em comunidades do Agreste Meridional. Os danos atingem a saúde mental, com consequências como insônia, ataques de pânico e ansiedade, e também a física, com prejuízos para visão e audição, hipertensão, lesões cardiovasculares e até mesmo alergias aos resíduos lançados no ar.

No estudo realizado na comunidade de Sobradinho, em Caetés, foi constatado que a distância média até as turbinas é de 411 metros, chegando a 100 metros em alguns casos. Wanessa diz que os infrassons podem causar danos em um raio de 15 quilômetros. “Então, é um conjunto de problemas né, a gente já fala da síndrome da turbina eólica e a doença vibroacústica, que já é devidamente estudado né, mostrando que essas torres, a aproximação e o contínuo convívio com essas torres leva para essas duas doenças e essa síndrome né, então isso a gente já consegue observar nas comunidades aqui de Pernambuco.”

A especialista mostrou índices apontando que o percentual de pessoas que fazem uso de medicação contínua chega a 70%, enquanto as que tomam remédio para dormir somam 64%. O cientista social Luiz Soares também apresentou estudo sobre os efeitos das linhas de transmissão, como exposição à radiação, desaparecimento de abelhas e pássaros, expulsão de agricultores e desvalorização de terras.

Os prejuízos não se limitam àqueles que cedem parte do terreno para os complexos eólicos. É o caso, por exemplo, do agricultor Simão Salgado, da comunidade Sítio Pau-Ferro, em Caetés. Depois que um vizinho negociou a instalação de nove aerogeradores, ele teve a propriedade cercada por torres, ficando a cerca de 200 metros de uma delas. Quando a esposa passou a sofrer de depressão, eles tiveram que abandonar a propriedade. Aos 75 anos, ele espera receber uma indenização para recomeçar a vida. “A minha esposa ela ficou agressiva, por conta dos impactos, ela não se alimentava bem, ela não dormia, e aí veio o grande problema, era só no médico, nos hospitais, e aí foi quando um dia ela olhou pra mim disse: ‘você vai esperar eu morrer para poder tirar eu daqui da propriedade?’ E estamos nessa luta pra ver se a gente é ressarcido de alguma forma pra recomeçar em outro local, porque lá não tem condições, a mínima condição de a gente retornar pra lá.”

Na mesma linha, Roselma Melo, da comunidade de Sobradinho, relatou as dificuldades de quem vive próximo às torres eólicas e pediu ações urgentes. “Nós estamos lá todos prejudicados, vivendo à base de medicamentos, assistência nenhuma, a gente não tem assistência com medicamento, não tem assistência para nada, Então, que vocês que possam fazer alguma coisa, que façam. Não esperem pelo amanhã não. Todo dia a gente vê, foi investido… BNDES investiu tanto em energias renováveis… Que renovável, gente? Está acabando com a nossa vida, acabou com a nossa vida. Hoje nós estamos obrigados a deixar o nosso canto, para quê, em nome de quê? Do capitalismo, de uma energia que a gente nem usa?”

Diretora da Secretaria Nacional de Diálogos Sociais da Secretaria-Geral da Presidência da República, Islândia Bezerra falou da comitiva que esteve em Caetés e em municípios da Paraíba para escutar as populações afetadas. De acordo com ela, um relatório final está sendo feito, a partir dessas visitas e outros estudos, para encaminhar propostas envolvendo diversos setores do governo federal. “Um dos objetivos da mesa de diálogo é criar esse espaço dialógico para que a gente possa encontrar as melhores alternativas, eu diria, né, para a sociedade brasileira, mas também para nós, né, do Executivo, pensar num desenvolvimento sustentável, né, que traga aí os benefícios que a gente espera para o País.”

Representando o Consórcio Nordeste, o advogado Anselmo Castilho defendeu a criação de uma legislação unificada tratando do licenciamento em toda a região. Álvaro Severo, do Instituto Serra Grande, defendeu a revisão – e anulação, se necessário – de contratos de arrendamento. Ele observou a defasagem dos equipamentos usados no Brasil, que ele tachou de “sucata da Europa”.

Neilda Pereira, da coordenação regional da Cáritas Brasileira, sugeriu ações como desligamento de torres, concessão de auxílio-emergencial aos prejudicados e apoio jurídico especializado à população durante as negociações de arrendamento.

Subdefensor de Causas Coletivas da Defensoria Pública de Pernambuco, Rafael Alcoforado pontuou a dificuldade para processar as empresas diante da falta de legislação. Já a assessora jurídica da Comissão Pastoral da Terra, Luisa Duque, citou Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente que impede o licenciamento simplificado para empreendimentos eólicos que inviabilizam comunidades ou em áreas com espécies endêmicas.

O debate da Comissão de Meio Ambiente foi realizado a pedido dos deputados da bancada do PT, tendo sido presidido pelo deputado João Paulo. Líder da bancada, ele lamentou a ausência da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, da Agência Estadual de Meio Ambiente e do Ministério Público. “Os depoimentos são dramáticos e nós esperamos que essa audiência pública aqui na Assembleia Legislativa tenha proporcionado iniciativas que venham reduzir, parar a instalação dessas novas eólicas no Estado, sem que as condições de segurança para as famílias não sejam garantidas.”

A deputada Rosa Amorim registrou as contradições entre um modelo de energia renovável e os impactos gerados nas comunidades. Doriel Barros lamentou que um projeto de lei apresentado por ele, estabelecendo distância mínima de 500 metros entre as torres e as casas, não tenha prosperado na legislatura anterior. Ele defendeu a necessidade de compensações ambientais para a instalação das usinas eólicas.

 
Alepe

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