Movida pelo instinto investigativo em mim plantado, desde os idos de 2016, pelo professor e historiador Gilberto de Menezes, saí a procura de respostas. Para minha surpresa, descubro inúmeros desses trilhos espalhados pela cidade. Em alguns, uma inscrição chamava a atenção: KRUPP 1880
Em 1880, a Estrada de Ferro Paulo Afonso, linha Piranhas -Jatobá , autorizada em 1878, encontrava-se no início de sua construção, que seria concluída em 1883. A data , ao que tudo indica de fabricação da peça, está, portanto, dentro do período das obras da ferrovia. Mas, e a expressão KRUPP, o que significa?
A Krupp AG, atualmente ThyssenKrupp AG, é uma empresa com sede em Essen, na Alemanha. Constitui-se num dos principais grupos industriais do país, tendo se destacado na produção de aço, armas, munições e equipamentos. Cresceu na primeira guerra mundial, com a venda de armas de longo alcance, e durante a segunda guerra mundial enriqueceu ainda mais servindo ao regime nazista. Gustav Krupp, diretor da indústria Krupp AG, chegou a ser condenado, acusado de usar mão-de-obra forçada de civis e prisioneiros de guerra dos campos de concentração.
Bem antes disso, durante o império, interessado em diminuir a dependência pelos produtos ingleses, D.Pedro II tentava desenvolver a indústria brasileira. Em busca de inovação , por várias vezes visitou a indústria da família Krupp, na Alemanha. Numa dessas visitas foi presenteado com um canhão de artilharia prussiana, cujo poder de fogo levou a Prússia a vencer a Áustria em 1866.
Não por acaso, os canhões KRUPP serviram aos países da tríplice aliança (Brasil, Argentina e Uruguai) e se mostraram decisivos no massacre final da guerra do Paraguai. Décadas depois, foram utilizados pelo governo para dar fim à rebelião de Canudos, após três tentativas frustradas, resultando na morte de pelo menos 30 mil pessoas.
Mas a relação do Brasil com o grupo Krupp não se restringiu ao comércio de armas. A empresa de Aibert Krupp, com sua expertise em inovação tecnológica, havia inventado o aro de roda inteiriço para os trens, o que representou um considerável progresso para as ferrovias no mundo todo. Assim, quando o império resolveu investir em ferrovias para escoar a produção, as empresas Krupp passaram a fornecer trilhos, desvios, rodas e acessórios, participando assim do desenvolvimento da malha ferroviária brasileira. Isso explica a marca impressa nos trilhos da Petrolândia. Eles foram produzidospela indústria KRUPP, no ano de 1880, e foram usados na estrada de Ferro Paulo Afonso, isso é fato.
Porém, se é de conhecimento geral que , na desativação da estrada de ferro em 1964, as peças da ferrovia foram transportadas para Recife, como se explica a existência de tantos trilhos na nova cidade de Petrolândia?
Conta Robson Gabriel de Araújo, filho de Agenor Gabriel Araújo, mais conhecido por “Seu Nozinho”, chefe responsável pelo desmonte de toda a linha férrea de Piranhas a Jatobá, que os trilhos da linha desativada foram, realmente, adquiridos pela empresa Aço Norte, do Recife. Lembra, porém, que durante os anos de atividade normal da linha, era comum a venda dos trilhos substituídos em função do desgaste pelo tempo de uso.
Utilizado como viga de sustentação na construção civil, havia grande demanda por esses trilhos. Era também frequente a procura por pedaços menores, vendidos por quilo, que além de outros usos, podiam servir como bigorna para facilitar o esforço do ferreiro ao forjar materiais de metal.
Assim, considerando esta antiga prática da venda à varejo, podemos supor que as barras de ferro que se encontram hoje em Petrolândia sejam resíduos dos trilhos comprados à Estrada de Ferro Paulo Afonso, ainda hoje utilizados na construção civil, desta vez como estacas.
Não se sabe ao certo como foram transportados para a nova cidade. O que se sabe é que, de tão significativa, todos queriam ter em casa uma recordação da Estrada que tão bem serviu à região durante 81 anos.
Adquiridas oficialmente ou por meio de amizade, na década de 60, eis que agora essas peças, como por encanto, ressurgem diante dos nossos olhos trazendo de volta memórias afetivas carregadas de histórias. E sem que estivesse programado, transformam a cidade em um memorial a céu aberto onde se pode aprender muito sobre importante período da história do mundo, do Brasil e de nossa região.
Aos professores, aos gestores da cultura local e do turismo, fica a dica.
Por: Por: Paula Francinete Rubens de Menezes
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