Bolsonaristas em atos terroristas em Brasília — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Um mês depois dos ataques terroristas em Brasília, parte dos golpistas permanece presa no Distrito Federal pelo vandalismo nos prédios públicos dos Três Poderes. O g1 conversou com a mãe de um desses presos. Ela ainda tenta entender o que levou o filho à Papuda. Com medo, a mulher pediu para não ser identificada pela reportagem.
Eram 11h30 de 9 de janeiro. O telefone tocava. No celular, um número de discagem de Brasília apareceu. A mãe recebia a notícia de que o filho havia sido preso por participação nos ataques terroristas contra os prédios dos Três Poderes no dia anterior.
“O que me entristece é que parece que foi feita uma lavagem cerebral no meu filho. Não dava para entender nada. Eu nunca vi um negócio como esse. Ele estava muito envolvido em uma lavagem cerebral mesmo. Ele mudou muito, uma lavagem cerebral”, compartilha a mãe sobre a mudança no comportamento do filho.
O homem largou o trabalho no interior de Mato Grosso do Sul e começou a "viver" em acampamentos bolsonaristas a partir do segundo semestre de 2022, como a mãe do preso explica.
“Ele saiu do trabalho para ir para os acampamentos. Ele foi de uma cidade para outra. Depois, ele veio para a capital [Campo Grande]. Aqui, ele chegou com tudo pago: passagem de ônibus e até carro por aplicativo. Isso tudo e ele já estava desempregado. Ele saiu do serviço e veio viver nos acampamentos”.
O contato já não era o mesmo, e a distância foi sentida pela mãe. As conversas com o filho eram sempre levadas para o tom político extremista. A mãe do rapaz diz que ele viu no ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) alguém para seguir, mas não soube distinguir a vida pessoal do extremismo golpista.
“No fim do ano, quando ele me ligou, já estava havia duas semanas no acampamento na minha cidade. Eu senti uma diferença muito grande. Saímos para ir ao mercado, mas ele estava bem diferente. Me falaram que ele estava louco. Acho que ele não chegou a ficar louco”.
Com as festas de fim de ano se aproximando e com o rapaz em um acampamento bolsonarista em Campo Grande, o convite para passar o Natal em família foi feito, como relembra a mulher. Ela achava que a virada do ano também seria reunida com o filho, mas foi diferente.
"Ele passou o Natal aqui em casa com a gente, com a minha família. Reunimos a família toda. Quando ele veio, pedi para ele não falar de política. Foi muito bom, não teve bebida, não teve política, conseguimos ter um Natal em paz. No ano novo, meu filho não quis passar com a família. Ele foi passar o Ano Novo com o pessoal em frente ao Comando Militar Oeste do Exército, no acampamento”.
'Mordomia'
A rotina da mãe do preso é intensa. Ela sai cedo para o trabalho, enfrenta transporte público coletivo e chega em casa só à noite. Para ela, o filho ter saído do emprego para viver nos acampamentos bolsonaristas não tem sentido.
Ao g1, a mulher conta que o filho pode ter recebido ajuda financeira e ter sido financiado para ir a Brasília. "Meu filho conseguiu muita mordomia. Ele estava desempregado em Brasília. Foi um choque quando ele me ligou e falou que ia sair do serviço e ir para o acampamento dos bolsonaristas. Eu falei para ele 'cara, você tá louco, o que você tá fazendo aí?'".
O rapaz saiu da casa da mãe em 2015. O contato permaneceu com o filho. A mulher explica que o rapaz “relaxou” com a emissão de documentos e até com as votações.
“Meu filho não mora comigo desde 2015. A gente nunca perdeu o contato. Desde que ele saiu de casa, ele relaxou com documento, até com voto. Eu acho que ultimamente ele nem votou. Como uma pessoa que nem vota diz que vai defender o Brasil? Como?”, declara inconformada.
Ida a Brasília
Segundo a mãe do preso, o filho foi três vezes a Brasília com todas as despesas pagas. Na última vez, o rapaz chegou em 6 de janeiro, dois dias antes dos ataques prédios públicos dos Três Poderes.
Antes de ir à capital federal, o preso ligou para a mãe avisando da viagem. Ele justitificou que iria "defender o país". A mãe foi contra e relutou para que ele deixasse a viagem de lado.
“Quando foi na sexta-feira, dia 6 de janeiro, meu filho me ligou avisando que iria para Brasília. Ele disse que ia para Brasília para ‘'defender o país’. Eu disse para ele: ‘larga a mão, não faz isso, você não precisa ir lá para Brasília’. Ele respondia: ‘eu prefiro morrer do que não defender o meu país’. Eu não sei, parece que fizeram uma lavagem cerebral nele, ele tava com a cabeça bem diferente”.
Antes do quebra-quebra, o rapaz ligou para a mãe. A caminho de um mercado para comprar alimentos para cozinhar para os outros bolsonaristas no acampamento em Brasília, o homem avisou que ia participar dos atos.
“Ele ligou outras vezes, ele ligou outras vezes à tarde. Acredito que ele não estava no Congresso. Pela última vez, ele me ligou e eu avisei, pedi para ele não ir. Falei que ia ser perigoso, mas ele retrucou e disse: ‘os policiais estão do nosso lado, não tem problema nenhum. Eles são nossos amigos e estão dando apoio’”.
“Ele foi para lá mesmo saindo tiro, bomba e gás lacrimogêneo na cara”. Até então, a última notícia que a mãe teve do filho golpista foi a da ligação de 9 de janeiro, quando informaram sobre a prisão por envolvimentos nos atos antidemocráticos. Um mês após, a mãe ainda busca na memória uma explicação para as atitudes individuais do filho.
“Eu sinto um aperto muito grande no coração, meu coração está despedaçado. Eu não me acho culpada porque eu nunca o incentivei. Tudo que aconteceu foi o menino que se criou e estudou, que conhece a vida, ele que fez. Eu não acredito que eu tenha me matado e sacrificado para criar um filho sozinha e chegar nessas alturas da vida e ver uma situação dessa: ver meu filho sendo preso por política”.
Por G1
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