quarta-feira, maio 05, 2021

Coragem de professoras evitou que tragédia em Santa Catarina fosse ainda maior


A tragédia ocorrida em uma creche no município de Saudades, na região oeste de Santa Catarina, teria sido ainda maior não fosse a coragem das professoras da instituição que agiram para proteger os alunos na manhã desta terça-feira. Por volta das 10h, um jovem de 18 anos invadiu o local e, com uma arma branca do tipo facão, matou cinco pessoas — entre elas, três crianças. Todas as vítimas receberam, pelo menos, cinco golpes de facão.

Ao perceberem o ataque, as professoras do CEI (Centro de Educação Infantil) Pró-Infância Aquarela rapidamente trancaram as salas em que estavam ocorrendo aulas naquele momento a fim de impedir que o jovem machucasse os alunos. Segundo a Polícia Civil, o jovem tentou entrar em todas as salas da creche.

''Elas, instintivamente, todas elas, se trancaram dentro da respectiva sala e seguraram as crianças para dentro para que ele [o jovem] não entrasse. Ele tentou entrar em todas as salas e não conseguiu. Com aquelas mulheres guerreiras lá, sozinhas com crianças pequenas, evitando que um mal maior acontecesse."

Em coletiva de imprensa realizada no fim da tarde de hoje, o delegado Jerônimo Marçal, responsável pelo caso, destacou a ação das docentes. "Meus parabéns às professoras que estavam lá, à bravura daquelas profissionais", disse ele.

No momento, cinco professoras cuidavam de 20 crianças. Segundo relatos de
moradores, elas teriam corrido para escondê-los no momento do ataque.

Keli Adriane Aniecevsk: "Uma super-heroína"

Apesar do ato de bravura, o ataque deixou duas professoras e três crianças mortas. A professora Keli Adriane Aniecevski, 30, estava na entrada da creche e se prontificou a atender o jovem quando ele apareceu no local, sem imaginar que algo de ruim poderia acontecer..

Pega desprevenida, acabou atacada a golpes de facão e, mesmo ferida, correu para alertar quem estava na creche. A professora acabou morrendo na escola.

Formada em Sistemas de Informação, Keli gostava tanto de crianças que conseguiu um emprego fora da sua área e virou professora da creche há mais de cinco anos. "Hoje a gente tem um projeto que vai repetindo ano após ano, que é o de revitalizar espaços infantis. Aqui na Aquarela, foi a primeira que a gente fez e foi por iniciativa dela. O solarius, onde as crianças tomam sol e precisava de mais cuidado", lembra o arquiteto Adryel Kreutz, 24, amigo de Keli..

"Ela foi uma líder, sempre foi uma pessoa que se destacou muito pelo compromisso, pela responsabilidade e pelo respeito pelo próximo em se doar.", lembra. No seu perfil no Facebook, Keli costumava compartilhar mensagens positivas e campanhas beneficentes. Entre as ações, publicou recentemente imagens de uma visita a um lar de idosos em Pinhalzinho, cidade vizinha. Também há posts de quando deixou o cabelo crescer para doá-lo.

''Ela foi uma verdadeira super-heroína. Conseguiu proteger várias crianças, mas perdeu a própria vida."Silvana Ester Helfer, prima da professora..

Mirla Renner: "Era filha única"

Segundo a Polícia Civil, após atacar Keli, o autor do crime entrou na sala onde estava a estudante universitária Mirla Renner, 20, que também morreu em decorrência do ataque. Ela trabalhava como agente de educação, auxiliando professores durante as aulas, e morreu após ser encaminhada para um hospital

Nas redes sociais, Mirla se apresentava como estudante de engenharia química na UDESC (Universidade do Estado de Santa Catarina). Padrinho de Mirla, o auxiliar de montagem Ademir Ternus, 47, estava no trabalho quando soube do incidente na creche por uma ligação com a esposa. Mal sabia que a afilhada havia sido esfaqueada no local.

''Ela era muito querida, simpática, muito dedicada aos estudos de engenharia. Era filha únicaAdemir Ternus, padrinho de Mirla Renner.

Aline Biazbetti: "Agi por impulso" Agente educativa, Aline Biazbetti, 27, ainda estava em casa durante a manhã, preparando-se para o turno que começaria à tarde. Do outro lado da rua, ouviu gritos de socorro.

"Era 8h, 9h. Estava em casa e escutei gritos de socorro. Quando sai para a rua vi as meninas da limpeza saindo pelo portão da frente, pedindo socorro: 'por favor liguem para a polícia que um cara entrou armado e está matando as crianças'", contou. Ao ver a cena, Aline diz que agiu no impulso e pegou uma das crianças e a levou até o hospital. "Poderia ter sido eu.".

As funcionárias e crianças mortas no ataque serão veladas ao mesmo tempo, em uma cerimônia coletiva, na manhã desta quarta-feira (5). Ainda não há informações se a cerimônia será aberta ao público ou se ficará restrita aos familiares e conhecidos das vítimas. Apesar disso, a prefeitura informou que "serão respeitados os protocolos sanitários" em razão da pandemia de covid-19

.Até hoje, a cidade de Saudades acumulava seis mortes em decorrência da infecção pelo novo coronavírus em toda a pandemia. No final de semana, a região foi classificada com status vermelho, de risco potencial gravíssimo para a covid-19 pela secretaria estadual de Saúde de Santa Catarina.

De acordo com o prefeito de Chapecó, João Rodrigues (PSD), cidade vizinha, o rapaz foi contido por dois cidadãos que entraram no local. "[O assassino] só não foi mais longe porque houve intervenção de um metalúrgico e de um pedreiro, que pegaram o garoto e o interromperam com golpes de barras de ferro", afirmou Rodrigues à rádio local.

Após a tentativa de suicídio, o jovem ficou estirado no chão, perguntando quantas pessoas havia matado, segundo informações do jornal O Globo. "Ele estava sangrando bastante, mas permaneceu consciente. Dizia que queria morrer", disse o soldado Raphael Blazech, do Corpo de Bombeiros de Santa Catarina.

De acordo com a Polícia Civil, o autor do ataque tinha o perfil de um jovem reservado e vinha sofrendo bullying na escola. A apuração inicial dos policiais também aponta que o jovem de 18 anos vinha maltratando animais e não queria mais ir à escola, onde cursava o ensino médio..

O homem não tinha antecedentes criminais ou passagens pela polícia. Até o momento, não se sabe qual foi a motivação do crime.

No município de Saudades, que tem cerca de 9 mil habitantes, o clima é de tristeza. Lojistas da cidade colocaram cartazes de luto nas vitrines do comércio local.

Estadão Conteúdo/UOL

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