quarta-feira, fevereiro 27, 2019
'Apego a poder, dinheiro é um vício', diz Sérgio Cabral em depoimento na Justiça Federal do RJ
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral prestou depoimento, na tarde desta terça-feira (26), na 7ª Vara Criminal Federal, no Centro.
Na audiência pedida pela defesa do ex-governador, ele deu mais detalhes sobre os esquema de corrupção, voltou a admitir ter recebido propina e chegou a dizer que dinheiro e poder são um "vício".
Cabral foi preso na Operação Lava Jato em novembro de 2016 e suas condenações somam 198 anos e 6 meses de prisão.
O que disse Cabral:
*admitiu que o esquema de "toma lá dá cá" era instituído no governo;
*que empresários dão dinheiro a campanhas em troca de vantagens;
*disse que recebeu mais de R$ 30 milhões de propina e caixa 2 do empresário Arthur Soares, o Rei Arthur;
*pediu desculpas ao juiz Marcelo Bretas por ter mentido antes: 'Dói muito';
*confirmou que US$ 100 milhões nas contas dos irmãos Chebbar no exterior eram dele;
*que 90% do que diz o delator Carlos Miranda é verdade;
*que o ex-governador Pezão recebeu propina e mesadas.
*que o ex-prefeito Eduardo Paes recebeu dinheiro de empresários ligados a ele para a campanha, mas *que não fazia parte da organização.
Côrtes e Fichtner
No início da audiência, Cabral citou os nomes de ex-colaboradores no governo como o ex-secretário de Saúde, Sérgio Côrtes, e Régis Fichtner, ex-chefe da Casa Civil do RJ. O ex-secretário de saúde está presente na audiência desta terça.
"Vim aqui para falar a verdade. Conheci Sérgio Côrtes na campanha de 2006 mais proximamente. Quando acabou a eleição eu falei para o Côrtes que tinha um contrato com o Arthur Soares e combinamos uma propina de 3% para mim e 2% para você. Antes nos governos anteriores Arthur disse que a propina era de 20%. Esse foi meu erro de postura, apego a poder, dinheiro... é um vício", disse o ex-governador.
O ex-governador Sérgio Cabral também afirmou estar arrependido por não ter falado de propinas anteriormente.
O ex-governador contou ainda que o então vice-governador Luiz Fernando Pezão (MDB), que acumulou o cargo, inicialmente, com a secretaria de Obras também recebia propinas. Segundo ele, o valor enviado a Pezão chegava a R$ 150 mil mensais.
"Pezão pediu a mim. Do Pezão, eu mandava entregar para ele. Eram cerca de R$ 150 mil por mês", disse
O ex-governador Pezão está preso desde o dia 29 de novembro do ano passado, em operação da Polícia Federal, no Palácio Laranjeiras. A prisão foi baseada em delação de Carlos Miranda, operador financeiro de Cabral, que disse ter feito pagamento de mesada de R$ 150 mil para Pezão, com direito a 13º de propina e bônus de R$ 1 milhão.
A defesa do ex-governador Pezão disse que ainda não teve acesso à íntegra das declarações, razão pela qual não irá comentar o depoimento de Sérgio Cabral.
Cabral explicou ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, o motivo de ter decidido falar das propinas no seu governo após mais de dois anos na prisão.
"O que minha família tem passado. E o senhor[ juiz] colocou um ponto importante: É uma situação histórica. Em nome da minha mulher[Adriana Ancelmo], da família e do momento histórico resolvi falar. Hoje sou um homem mais aliviado e vou ficar cada vez mais aliviado. Por isso decidi falar a verdade para ficar bem comigo mesmo", explicou.
Secretários
No depoimento, Cabral citou secretários que sabiam dos esquemas de propina dentro do governo e outros que não sabiam da organização para recebimento do dinheiro.
Os isentos de cobrança de propina são: Renato Villela e Joaquim Levy, que ocuparam a secretaria de Fazenda e Nelson Maculan e Wilson Risolia, que foram secretários de Educação.
Os que tinham conhecimento do esquema criminoso: Régis Fichtner, Wilson Carlos, Carlos Miranda e Hudson Braga. De acordo com o ex-governador, houve esquemas em todas as áreas da saúde estadual: escadas magirus, carros de bombeiros, caminhão da ressonância, tomógrafo móvel.
“Atendemos milhões de pessoas. Poderíamos ter atendido mais”, explicou Sérgio Cabral.
Eduardo Paes
O ex-prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, também foi citado no depoimento. Segundo Cabral, Paes, que foi seu ex-secretário de Esporte e Lazer, não participava do esquema de propinas, mas disse que montou o esquema de Caixa 2 de Eduardo Paes para a prefeitura. Segundo ele, o valores eram repassados para o deputado Pedro Paulo.
Em audiências anteriores, Cabral negou que o dinheiro repatriado pelos doleiros irmãos Chebar, que repatriaram em 2017 o valor de R$ 270 milhões de reais como parte de um acordo de delação premiada. Nesta terça, Cabral mudou de postura e admitiu que o dinheiro era dele.
O ex-prefeito Eduardo Paes disse que todos os valores recebidos na campanha de 2008 foram declarados à Justiça Eleitoral e que as contas foram aprovadas. O ex-prefeito ressaltou que o depoimento de Sérgio Cabral revelou que ele nunca pediu propina, não beneficiou qualquer empresa e nem fez parte de qualquer organização criminosa.
O deputado Pedro Paulo (DEM)) disse que nunca participou de qualquer reunião ou arrecadação de campanha que não tenha sido devidamente contabilizada e declarada à Justiça Eleitoral na prestação de contas.
Dom Orani Tempesta e Miguel Iskin
Sem dar nenhum detalhe, valores ou datas, Cabral fez acusações graves à Arquidiocese do Rio de Janeiro. Ele disse não ter dúvidas do envolvimento da Arquidiocese com esquema de propinas envolvendo as Organizações Sociais.
"Eu não tenho dúvida de que deve ter havido esquema de propina com a Igreja Católica. Da Pró-Saúde[OS] eu não tenho dúvida, o Dom Orani devia ter interesse nisso.
Com todo respeito ao Dom Orani, mas ele tinha interesse nisso, tinha o Dom Paulo (sem dar o nome completo) que era padre e tinha interesse nisso e o Sergio Côrtes nomeou a pessoa que era o gestor do Hospital São Francisco, que fazia um belo trabalho, cá entre nós. Nós atendemos a idosos com trauma de quadril, por conta também desse vínculo com a profissão dele com os interesses do Iskin [Miguel]. Essa Pró-Saúde certamente tinha esquema de recursos que envolvia inclusive religiosos", afirmou Cabral
A Arquidiocese divulgou nota informando que o único interesse da Igreja Católica no Rio e de seu arcebispo, Dom Orani Tempesta, é de que as organizações sociais cumpram seus objetivos de servir ao bem comum, respeitando as leis.
Miguel Iskin divulgou nota sobre a citação do nome dele no depoimento. "O desespero leva pessoas a inventar fatos. Difícil dar credibilidade a acusações, antes negadas, de quem está condenado por mais de 300 anos de prisão”.
A Pró-Saúde afirmou em nota, que "tem colaborado com as investigações e, em virtude do sigilo do processo, não se manifestará sobre os fato. A entidade filantrópica reafirma neste momento o seu compromisso com ações de fortalecimento de sua integridade institucional, bem como com a prestação de um importante serviço à saúde do Brasil".
Por Arthur Guimarães, Leslie Leitão e Paulo Renato Soares, TV Globo, G1Rio e Globonews
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