Nesses últimos dias venho acompanhando através de grupos watsapp, em conversas informais, sobre a situação em que se encontra o Projeto Icó-Mandantes.
Há meses vínhamos sustentando o abastecimento de água e pequenos reparos, através de uma taxa mínima de 50 reais por lote e 20 reais por família que não possui lote, paga por cada agricultor consciente de sua responsabilidade.
Em reunião realizada na Agrovila 01 dos Mandantes, no dia 24/10, sob a coordenação do Distrito (órgão criado com a finalidade de administrar, no futuro o projeto) e com a presença de agricultores, prefeitura, vereadores, deputado e representante do governo federal, foi definido que, em 31 de outubro seria paralisado o fornecimento de água do projeto, segundo acordo já firmado com os agricultores em assembléia a três meses atrás. Esta paralisação objetivava pressionar o poder publico a resolver em definitivo a situação de pendências em que se encontram todos os projetos criados a partir da Barragem de Itaparica. Nesta reunião, os representantes do distrito, a prefeitura, o sindicato e outros se comprometeram em buscar as instâncias responsáveis, para encontrar uma solução. Todos os presentes na reunião concordaram, pois foi dito que não somente o Icó-Mandantes, mas também o Apolônio, o Fulgêncio... iriam aderir à paralisação de modo, que ganhasse força o movimento. Entretanto, isso não aconteceu. Logo soubemos que os agricultores estavam se organizando para continuar o sistema que já vinha acontecendo a meses, ou seja, cada um dando uma contribuição para que os bombeiros pudessem ligar as bombas e os agricultores não perdessem suas lavouras.
Por esta razão, um grupo de agricultores do Icó-Mandantes se uniram e foram procurar a CODEVASF a fim de pegarem as chaves das EBs. Assinaram um termo de responsabilidade, reuniram os agricultores que quiseram e se interessaram em ouvir e novamente, todos deveriam assumiram o pagamento dos bombeiros.
Diante disso, ouve muitas críticas por parte de quem não concordava em quebrar um compromisso assumido em assembléia com o distrito.
Entretanto precisamos refletir alguns pontos:
• Somente o Ico-Mandantes tem pendências a resolver pelo Governo federal? Se não é somente nós, porque teríamos que ser os mártires da situação?
• Será que todos os demais projetos, funcionando com a contribuição do agricultor, somente nós seremos “penalizados”, por estarmos fazendo o mesmo?
• Ouço muitos dizerem que, os mais “aperreados” por água são os agricultores que teimaram em plantar “rameira”(mesmo sendo avisados que essa paralisação ia acontecer). Mas quem não tem fruteira situada e vive de “rameira”, como iria sustentar a família se passasse de 4 a 6 meses sem produzir nada pela incerteza da água?
• Quem tem plantio de fruteira? Diante desse sol, quantos dias essa planta sobreviverá sem trazer prejuízo de produção?
• Quantos anos cada agricultor levou para situar um plantio de coco, por exemplo, só investindo e agora que chega o momento de ter retorno, ele precisará esperar mais 6 meses para isso?
• Por que essas reivindicações não podem ser feitas com o produtor trabalhando? Temos consciência que essa luta não é de agora. São muitos anos reivindicando documentos, dando plenos direitos de posse da terra ao agricultor, troca de bombas que já estão sucateadas e ultrapassadas, indenização de lotes descartados por não produzir, troca de encanação furada, causando desperdício de água...
• Como ficaria o funcionamento das escolas, que precisam garantir os 200 dias letivos? Temos ciência de alguns prejuízos quanto a essa garantia, porque ao longo do ano temos problemas de falta de merenda, ônibus que quebra... Mas somado a tudo isso, seria justo, juntarmos mais esse prejuízo, que pode ser contornado?
• E por fim, o mais grave. Quantos dias a população do projeto teria reserva de água para abastecimento humano? Talvez 5 ou 8 dias, no máximo. E depois? Quem iria socorrer a todos? A prefeitura, na assembléia, deixou claro para todos, que não teria condições de suprir 17 comunidades com carro pipa. E, não vejo isso como má vontade ou irresponsabilidade administrativa, não. Vejo como alguém que vê a realidade e diz a verdade.
Não sou reassentada, nem agricultora, mas sou filha de agricultor florestano e com muito orgulho. Cheguei a este lugar em 1988, como professora. Conheço e acompanho a história do projeto. Faço parte dela. Quando aqui cheguei, muitos que hoje lutam por ele, eram criança ou talvez nem tivessem nascido ainda. Mas hoje, lutam por algo que é seu e isso é muito bonito. Porém, não se tem registro de que, família que se dividiu conseguisse alcançar o SUCESSO. E, todos nós que aqui moramos, precisamos entender que somos uma grande família. Se juntos não conseguirmos o que queremos, inútil será nossa luta separada! Se um ganha, todos ganharão, se um perde, perderemos todos. Pensemos nisso!
Paz e Bem.
Marinalva Silva – Professora e ex-diretora da Escola Icó-Mandantes
03/11/2018