segunda-feira, julho 23, 2018

Presidente da Chesf pretende investir R$ 800 milhões na conclusão de 34 empreendimentos de transmissão que estavam paralisados

Fábio Alves diz que este ano devem ser concluídos 34 projetos de transmissão de energia. Foto: Leo Malafaia / Esp. DP

Empossado em maio como presidente da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), Fábio Alves pretende investir R$ 800 milhões na conclusão, até o fim do ano, de 34 empreendimentos de transmissão que estavam paralisados ou atrasados. O gestor já tem planos de finalizar outros 35 empreendimentos em 2019, além de investir também no setor de geração. Em entrevista exclusiva ao Diario, o gestor destacou ainda que a estatal vem trabalhando para enxugar despesas e melhorar a eficiência de suas atividades.

O novo presidente assumiu a estatal – subsidiária do sistema Eletrobras – em meio ao debate sobre a privatização do sistema elétrico nacional e defende de maneira aberta a desestatização, argumentando que não se trata de uma venda. Muito embora o projeto que trata da privatização tenha sido adiado no Congresso Nacional, Alves destaca que “a discussão chegou em um ponto que não desaparece mais” e que o tema certamente voltará à pauta. O presidente nega, ainda, que o Rio São Francisco será privatizado.

A Chesf fechou 2017 com uma redução de 73,8% no lucro em relação a 2016. O senhor assumiu a presidência com o desafio de melhorar a eficiência da companhia. Como atingir esse objetivo?


Nesse lucro estão todas as receitas e despesas. O que formou esse resultado, em grande parte, foi uma verba indenizatória decorrente da não remuneração dos ativos de transmissão, que entraram na Medida Provisória 579 (aprovada em 2012 e que modificou a forma de cálculo do setor elétrico para que houvesse queda nas tarifas de energia). De 2012 a 2017 não houve remuneração. Então, é uma parte deste passivo que está sendo reconhecido. De R$ 1 bilhão de resultados finais (lucro da empresa em 2017), R$ 800 milhões foram decorrentes desta receita. A receita operacional dos resultados da empresa foi R$ 200 milhões. Não é um resultado operacional. Desse resultado teria que ser expurgado essa receita para a gente analisar o resultado da empresa sem esse fator.

Como será essa amortização?
A amortização se dará em oito anos. Estamos no segundo ano. Temos que fazer o dever de casa, porque o recurso vai decrescendo a cada ano, já que uma parte desse ativo vai se depreciando. Nessa remuneração já esta uma parte da amortização da depreciação. Vai chegar no oitavo ano e esse ativo não tem mais remuneração, apenas o custo de Operação e Manutenção. Então teremos que fazer novos projetos.

O preço da energia é um desafio. Hoje a Chesf vende o megawatt (MW) por R$ 9, enquanto outras empresas vendem por um valor até 16 vezes maior. Por que?
Com a MP 579, o que a Chesf recebe hoje é um montante para cobrir os custos operacionais (operação e manutenção). Ano passado esse montante foi na faixa de R$ 480 milhões. Então você pega essa receita e divide pela garantia física de usinas da Chesf e vai chegar a um valor médio por megawatt (MW) de R$ 30. Desse montante, metade se paga de tributos, e o que fica líquido para a empresa seria na faixa de R$ 9. Essa energia é chamada por cota porque pegou a capacidade que essas usinas tinham de gerar e rateou entre as distribuidoras por um determinado preço, com uma cota para cada distribuidora. Essa cota não pode ser confundida com o preço da energia no mercado. Quando se transformou as usinas em regime de cota, você tirou do gerador o risco hidrológico do déficit de energia, que é um risco assumido pelo produtor quando está em regime de geração independente. Com o regime de cotas isso desaparece. E quem paga essa diferença? É o consumidor lá na ponta.

Como mudar esse cenário?
No ano passado, o custo médio da energia, quando levamos em consideração o custo da geração adicional, sai de R$ 30 para R$ 150 (por MW). Hoje, a energia no mercado de curto prazo está em R$ 505. A Chesf hoje tem as usinas cotizadas. A empresa não é uma produtora independente. Com o projeto de desestatização, é previsto que essas usinas sejam revertidas novamente para um regime de produção independente. Isso daria um ganho econômico para a usina e uma parte desse ganho seria paga para ao governo federal.

E quais as suas estratégias para recuperar a receita?
Através da entrada de novos empreendimentos. Tinhamos um passivo de obras que estavam atrasadas ou paralisadas. Em 2016, a Eletrobras injetou recursos (via empréstimo) para possibilitar tocar esse programa de obras. Uma parte das receitas que estamos recebendo estão sendo utilizadas para financiar essas obras. Este ano, devemos concluir cerca de 34 empreendimentos de transmissão, em um investimento próximo a R$ 800 milhões. Eles devem gerar uma receita a mais de R$ 94 milhões por ano. Portanto, estamos concluindo as obras que estavam paralisadas que vão gerar novas receitas. São elas que vão dar o reequilíbrio daqui para frente.

Esse investimento deve valorizar a empresa para uma possível privatização?
Esse montante vai gerar um acréscimo de R$ 94 milhões na receita por ano. Portanto, o valor líquido da Chesf melhora. No caso da modelagem que foi feita para a privatização do grupo Eletrobras, não tem uma relação direta, porque não se está vendendo o grupo. O que o governo está fazendo é um lançamento de ações primárias, portanto novas ações seriam colocadas no mercado. Nesse momento a participação da União é de 51% e o BNDES tem 12,53%. Será feito um lançamento suficiente para o governo ficar abaixo de 51% (de participação) sem vender uma ação. Quem vai dar o valor dessas ações é o mercado. Seria uma venda em bolsa das ações.

Nesse processo de privatização, a Chesf vai ser vendida?
Não existe uma venda da Chesf. A Eletrobras está abrindo mão do controle acionário. Essas ações serão transformadas em uma classe especial chamada golden share, que dá direito à Eletrobras, ou à União, a ter alguns vetos. Se (o agente privado) quiser extinguir algo, ela (a União) veta. Se quiserem levar a Chesf daqui pro Rio de Janeiro, por exemplo, há vetos. E na modelagem está previsto que nenhum acionista terá direito de voto superior a 10% do capital votante. Mesmo que tenha 40% do capital, o voto dele só vale 10% do capital votante. Isso significa que ninguém terá mais de 50% do capital votante da empresa. É um regime de cooperação. Então essa modelagem, caso prospere, o comprador preferencial das ações normalmente não serão empresas de energia, serão fundos de investimento.

Qual a sua opinião sobre a privatização?
Há uma necessidade de reequilibrar as empresas do Grupo Eletrobras. Caso não seja desestatizada, a empresa vai precisar que a União faça aportes para cobrir os serviços que existem, as dívidas, e sabemos que o governo federal não dispõe desse capital. É uma forma de capitalizar a empresa e possibilitar, inclusive com esse mecanismo de retomada das empresas para (o formato) de produção independente, um aporte de recursos na Eletrobras, não apenas na Chesf. Outro aspecto que valorizo muito é que esse movimento também dará uma maior governança. Porque de certa forma você blinda mais a empresa para indicações políticas. Apesar de a lei das estatais criar um mecanismo de pré-requisitos para ocupar esses cargos, sabemos que muitas vezes um bom currículo não significa um bom profissional. E mudanças de governo, onde negocia-se aqui, muda cargo ali, é ruim para qualquer grupo econômico. Portanto, daria maior estabilidade de governança às organizações. O setor elétrico é um mercado de competição. Se você não tiver as mesmas ferramentas que o seu competidor, não há como competir, seja em leilões de transmissão, geração, venda de energia...

Existe outra alternativa para tornar o sistema Eletrobras mais competitivo?
Independentemente de desestatizar ou não, temos que fazer o dever de casa. Precisamos ver onde há desperdícios, excessos, e procurar as melhores práticas de gestão. A Eletrobras, por exemplo, desde 2006 vem fazendo esforço de melhorar o seu perfil, reduzindo dívidas e tornando-se uma empresa mais enxuta. No ano passado tivemos um programa de desligamento voluntário, que desligou quase mil pessoas (de toda a Eletrobras). Como é possível reduzir o quadro de pessoal? Adotando tecnologia, automatizando subestações e adotando processos informatizados que reduzem a demanda. Para esse ano estamos com um novo programa. Há um esforço que vem sendo feito na redução de material, serviços e outros custos. São práticas mais eficientes de gestão. É preciso tornar a empresa mais competitiva.

Como o senhor avalia o arquivamento do projeto que trata da privatização?
É muito mais uma questão de fato do que de decisão. A partir de agora, o Legislativo vai estar voltado para as eleições. E sabe-se que do ponto de vista político é um momento crítico, porque as pessoas se resguardam para não tomar medidas que não sejam populares. Mas o projeto está arquivado? Não. Eu diria que está em stand by. Dependendo de quem assumir o governo, o tema volta à pauta, seja para prosseguir ou para encerrar (o debate). Ele tem que voltar. A discussão chegou num ponto que não desaparece mais.

A desestatização significa a privatização do Rio São Francisco?
Eu diria que não. É muito mais uma colocação política. Porque quem define o fluxo da água do rio é a Agência Nacional de Águas (ANA), que vê as necessidades de usos múltiplos e define qual a vazão, com base nas previsões hidrológicas. Se não fosse essa restrição, no ano passado o rio tinha ficado a fio d’água.

Quais os planos para 2019?
No ano que vem, deveremos concluir mais 35 obras de transmissão. E vamos começar a investir na geração. Nesse ano, a agência reguladora (Agência Nacional de Energia Elétrica) autorizou as empresas a investirem na modernização das máquinas e na revitalização. Portanto, vamos começar a trabalhar nessa área. E teremos recursos para isso, que virão do setor elétrico. Nesse curto prazo a situação da Chesf é de ir caminhando para uma normalidade.

Diario de Pernambuco 

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