O aprofundamento das investigações da Polícia Federal no inquérito que apura se ocorreram contrapartidas para a publicação de um decreto que alterou regras para empresas que operam no setor de portos tem comprometido ainda mais pessoas próximas ao presidente Michel Temer. Documentos encontrados em uma ação da Operação Skala apontam que o coronel aposentado da Polícia Militar de São Paulo João Baptista Lima Filho, amigo do presidente, enviou dinheiro ao exterior sem declarar à Receita Federal. Lima chegou a ser preso por dois dias durante a operação, no fim de março.
Os documentos estão em posse do Supremo Tribunal Federal (STF) desde o dia 23 do mês passado. O coronel Baptista é dono da Agerplan — empresa voltada para o segmento de urbanismo e engenharia que atua há mais de 40 anos no mercado. A PF encontrou indícios de que ele teria recebido R$ 1 milhão ao participar, por meio da empresa de sua propriedade, de um contrato firmado pela Engevix para realizar obras da Eletronuclear, estatal do setor de energia.
De acordo com uma manifestação enviada ao Supremo pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, um executivo da Engevix, José Antunes Sobrinho, afirmou em seu depoimento que a empresa só conseguiu contrato com a estatal por ser ligada ao presidente Temer. Antunes está negociando um acordo de colaboração com a Polícia Federal. O Correio apurou que as tratativas já estão avançadas. Ele prestou novo depoimento à PF, em Brasília, na noite de ontem.
Alguns arquivos, que foram encontrados pelos investigadores na sede da Argeplan, revelam que o coronel Lima fez negócios com o Grupo Libra, investigado por supostamente repassar propina ao presidente para ser beneficiado com as mudanças no setor portuário. O relatório do MPF também solicita investigações sobre as empresas PDA Administração e a PDA Projeto e Direção Arquitetônica, que têm Baptista como sócio e dispõem de R$ 23 milhões em suas contas. A PF investiga a origem desses recursos.
Em informações prestadas à PF, o empresário Gonçalo Torrealba, um dos sócios do Grupo Libra, afirmou que foi procurado pelo coronel Lima “há mais de dez anos” para fornecer ajuda financeira para a campanha do presidente Temer a deputado federal. A informação, embora se refira a fatos antigos, contradiz as respostas do chefe do Executivo aos questionamentos feitos pela corporação. Ao ser indagado por escrito, Temer disse que “João Batista Lima o auxiliou em campanhas eleitorais, mas nunca atuou como arrecadador de recursos”.
Decreto
As investigações começaram meses após Temer realizar mudanças em um decreto que normatiza regras para a concessão e uso de portos em todo o país. Os investigadores suspeitam de que as alterações na legislação beneficiaram empresas do setor portuário, como a Rodrimar, que opera o Porto de Santos, o maior do país.
O artigo 19 da lei foi alterado, prevendo a ampliação de 25 anos para 35 anos os prazos dos contratos de concessões e arrendamentos, possibilitando que possam ser prorrogados até o limite de 70 anos.
O Planalto adotou o silêncio em relação ao cerco ao coronel Lima. A orientação no governo é não se manifestar. Temer manteve normalmente a agenda. Recebeu ministros que integraram até o início desta semana o comitê responsável por monitorar o abastecimento após o acordo com os caminhoneiros, como Eliseu Padilha, da Casa Civil, Carlos Marun, da Secretaria de Governo, e Sérgio Etchegoyen, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
A reportagem tentou contato com o advogado Cristiano Benzota, que defende o coronel Baptista, mas ele não estava em seu escritório, nem retornou as ligações.
Origem da suspeita
As suspeitas sobre o coronel Lima surgiram durante a Operação Patmos, em maio do ano passado, que investigou uma suposta tentativa de compra de “silêncio” do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha. A suspeita da PF era de que o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, visto correndo com uma mala com R$ 500 mil em espécie, em São Paulo, era um dos possíveis intermediários de repasses ilícitos ao presidente Temer. O dinheiro seria para impedir Cunha de firmar um acordo de delação premiada. O avanço das diligências colocou o coronel Lima como suspeito.
Por Correio Braziliense
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