Hidekichi Miyazaki após recorde em corrida de 100 metros, aos 105 anos, em 2015 (Foto: Toru Yamanaka/AFP)
Por Américo Tângari Jr*
Então, o melhor a fazer é trazer a imaginação para a realidade, pois tudo isso está em fase avançada de desenvolvimento e não é nenhum exercício de futurologia acreditar nesse novo mundo funcionando dentro de vinte anos. Pois é, vinte, apenas.
O mais fantástico de tudo é que a tecnologia vai, ao mesmo tempo, alongando a vida dos seres humanos e já é possível vislumbrar uma longevidade para além dos cem anos para boa parte da população mundial. Aparelhos de alta precisão poderão antecipar diagnósticos ainda difíceis de detectar. E se robôs podem realizar hoje cirurgias mais delicadas, imagine-se daqui a duas décadas.
Mas não há projeto para milagre – isso ainda pertence ao departamento de divindades. Por isso, o coração deve estar preparado para bater por muito mais tempo, desde que se cuide bem dele, com visitas periódicas ao cardiologista, exercícios rotineiros, uma vida saudável, sem estresse e sem vícios ainda comuns, como o sedentarismo ou o cigarro. Esta parte não muda, mesmo porque nenhuma tecnologia pode prever a reinvenção do homem.
A média de vida aumenta três meses a cada ano. Em 2013, a expectativa de vida era de 79 anos nos países desenvolvidos e no ano passado aumentou para 80. É um aumento natural, de forma que em 2037 a vida média naqueles países estaria por volta de 85 anos pelas condições atuais. Estaria, se o futuro não viesse tão depressa.
A conta no Brasil é mais modesta, de 72,7 anos atualmente. Mas vem aumentando, em razão do crescimento econômico. Essa longevidade serve para avaliar a qualidade de vida da população de um determinado lugar.
Mas bem sabemos que o Brasil ainda se encontra capenga diante dos países desenvolvidos. Depois, o percentual médio brasileiro no quesito esperança de vida não reflete a realidade, pois particularidades regionais são camufladas e oscilam de Estado para Estado.
É o resultado de uma história errante desde o Descobrimento. E por maior que seja a pressão da sociedade por serviços básicos de qualidade, os governantes em geral ainda não conseguem retribuir para o povo uma das mais elevadas cargas tributárias do Planeta.
O certo é que a civilização avança e mesmo países em desenvolvimento como o nosso e os mais pobres, como a maioria dos africanos, acabam por acompanhar lentamente, apesar dos pesares.
Um dos avanços na área da medicina deve entrar em operação em breve: um software desenvolvido pela empresa de sequenciamento genético Ilumina em parceria com a IBM Watson para fornecer relatórios mais precisos no combate ao câncer.
Por meio de uma amostra do tumor do paciente, o sistema de computação cognitivo poderá analisar os dados, de modo que o médico tenha informações minuciosas para um ataque mais eficaz à doença. E bem no início, fundamental para a cura.
Na área cardiológica, os avanços também são rápidos e permanentes, desde os transplantes e a descoberta de novos medicamentos para evitar a rejeição, passando pelos stents – que, em muitos casos, evitam as cirurgias mais invasivas -, cirurgia robótica, corações mecânicos e outros tratamentos cada vez mais eficientes. Se o paciente contribuir com uma existência saudável, essa bomba de sangue do organismo seguramente vai sobreviver por mais de cem anos, sem sobressaltos.
E tudo leva à prevenção. Como o Tricorder, em vias de chegar ao mercado - um aparelho portátil para autodiagnosticar condições médicas e coletar sinais vitais básicos em questão de segundos. Ele pode, por exemplo, digitalizar a retina, colher amostra de sangue ou medir a respiração – e ainda analisar 54 biomarcadores para identificar doenças.
Nem o humor e a mentira vão escapar. O aplicativo "Moodies" poderá mostrar se o portador está bem ou mal-humorado. E em 2020 haverá aplicativos para revelar, por meio de expressões faciais, se alguém está mentindo. Basta imaginar um debate político...
Em breve não precisaremos mais de automóveis, a locomoção será por carro autônomo. Na verdade, vamos precisar de 90 a 95% menos de carros e os estacionamentos poderão virar parques. O mais importante: um milhão de vidas será salvo em razão disso. Hoje, um milhão e duzentas mil pessoas morrem a cada ano em acidentes de trânsito em todo o mundo – o que equivale a um acidente a cada cem mil quilômetros. Com a condução autônoma, esse número deve cair para um acidente a cada dez milhões de quilômetros. As principais indústrias automobilísticas serão Tesla, Apple, Google.
Em seu livro “Crônicas de uma Sociedade Líquida”, Umberto Eco dizia que “continuamos a acreditar que vivemos numa época em que a técnica dá passos gigantes e diários... mas refletimos com menor frequência sobre o fato de que o aumento do tempo médio de vida é o maior avanço da humanidade”.
E lembrava: “Os computadores já eram anunciados pela máquina calculadora de Pascal, que morreu aos 39 anos e já era considerada uma bela idade. A propósito, Alexandre Magno e Catulo morreram aos 30, Mozart aos 36, Spinoza aos 45, São Tomás aos 49, Shakespeare e Fichte aos 52, Descartes aos 54 e Hegel, velhíssimo, aos 61”. Umberto Eco morreu em fevereiro do ano passado aos 84 anos.
Como se vê, a tecnologia apressa a chegada das coisas, mas o que importa mesmo é alongar a vida dos homens, sem nenhum milagre à vista no periscópio. O que há é muita inteligência a serviço do bem-estar da civilização. Que não funciona, sem a batida firme do coração.
E se assim é, façamos um brinde aos cem anos.
(*) Américo Tângari Junior é especialista em cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia, Associação Médica Brasileira e da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
GT Marketing e Comunicação
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