Hoje, existem 2.465 Caps no país. No Centro-Oeste, há 146 Caps; no Nordeste, 860; no Norte, 161; no Sudeste, 862 e no Sul, 426. Do total, 424 são especializados no atendimento a problemas com álcool e drogas.
Os Caps fazem parte da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) que atende pessoas com problemas psiquiátricos e articula serviços e equipamentos variados como os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), os Centros de Convivência e Cultura, as Unidades de Acolhimento e os leitos de atenção integral em hospitais gerais.
Há outros equipamentos públicos que também precisam ser melhor distribuídos. Enquanto há apenas um Serviço Residencial Terapêutico (SRT) no Amazonas, viabilizando moradia a pessoas em situação de vulnerabilidade que ficaram longos períodos internadas em hospitais psiquiátricos ou de custódia, no Rio de Janeiro há 65.
A vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Ana Pitta, aponta que a cobertura assistencial cresceu até 2011, mas perdeu força nos últimos anos.
Para o Ministério da Saúde, o problema não é só de distribuição, mas de efetivação das ações. Levantamento aponta que, em 2016, 8,5% dos Centros de Atenção Psicossocial não registraram sequer um tipo de atendimento.
“Em 2017, nos últimos três meses, 385 (15,6%) de todos os Caps não registraram qualquer tipo de atendimento, o que deixa nosso monitoramento da eficácia dessa política bastante comprometido”, avalia Quirino Cordeiro Junior, coordenador de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do ministério.
Subnotificação ou até mesmo a falta de prestação de serviços são apontadas como possíveis explicações para a ausência de dados.
As duas possibilidades, avalia Quirino, são “muito ruins” para o sistema público de saúde. “Se a gente não tem dados fidedignos, a gente tem dificuldade de planejar as nossas políticas públicas. Se o serviço não existe, é uma situação pior ainda”, avalia.
Além de deixar a população desassistida na prática e não informar o problema aos órgão competentes, o governo “aporta recursos que não estão sendo investidos”, alerta o coordenador da política.
De acordo com o ministério, em dez anos, a pasta repassou mais de R$ 185 milhões para financiar serviços que não foram concretizados. O orçamento federal destinado à saúde mental é de R$ 1,3 bilhão por ano.
Diante desse quadro, ele defende a elaboração de diagnósticos mais precisos, com vistas à avaliação dos serviços e ao desenvolvimento de uma política eficaz, inclusive por meio de ações regionais.
Os Caps são importantes para concretizar a política de desinstitucionalização, com a substituição do atendimento em leitos psiquiátricos. Apenas casos graves de intenso sofrimento mental devem levar à internação do paciente – ainda assim, por um curto período de tempo, de acordo com determinação legal. Quando doentes precisam de outros cuidados, o que pode ocorrer, por exemplo, com pessoas que tiveram órgãos prejudicados devido ao uso abusivo de drogas ou outras intercorrências clínicas, são acionadas as vagas em leitos de saúde mental em hospitais gerais, que também fazem parte da Rede de Atenção Psicossocial (Raps). No Brasil, existem apenas 1.164 leitos destinados à internação de pessoas com doenças mentais em hospitais.
Leitos
Levantamento do Ministério da Saúde aponta que metade dos leitos destinados às pessoas com problemas mentais em hospitais gerais não está sendo ocupada, o que levantou discussão sobre a política de internação que tem sido adotada no Brasil.
Em vez de reduzir os aportes para esses leitos, o psiquiatra e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Luís Fernando Tofoli, defende que é preciso avaliar a distribuição desses leitos e, inclusive, ampliá-los. Para isso, afirma que é preciso desenvolver ações que levem à ocupação dos hospitais gerais.
“A psiquiatria é uma especialidade médica como outra qualquer, por isso não faz sentido que suas internações sejam exercidas em um hospital segregado das demais especialidades”, explica.
A falta de ocupação de leitos diagnosticada pelo ministério, na opinião do especialista, pode estar ligada ao menor retorno econômico que hospitais conveniados têm com os atendimentos. Na avaliação dele, é preciso uma política de fomento à ocupação desses leitos.
A psicóloga Juliana de Paula avalia que a baixa ocupação pode estar relacionada com a inexistência de equipes especializadas. Medidas de contenção química e física, por exemplo, exigem formação específica, o que ainda falta no Brasil.
A formação também é apontada como importante para a garantia de direitos nesse atendimento, segundo o professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Marcos Roberto Vieira Garcia, que coordena o Grupo de Pesquisa Saúde Mental e Sociedade. “Ainda há um estigma sobre a loucura, mas também uma formação inadequada nas faculdades de medicina sobre a abordagem da saúde mental”, afirma.
Garcia levanta a hipótese de que o preconceito continua afastando as pessoas com problemas mentais dos hospitais comuns. Ele cita como exemplo o programa federal que abriu vagas para pessoas usuárias de crack receberem tratamento nesses locais. “O governo tentou fazer isso, pagaria R$ 300 a diária da internação e, ainda assim, não houve adesão”, avalia.
Apesar das dificuldades, Juliana e Garcia defendem ampliação da rede de atendimento, com direcionamento de recursos para a expansão dos Caps pelo país, bem como de leitos em hospitais gerais.
Outras medidas que não seguem o modelo centrado nos hospitais também são apontadas pelos especialistas como fundamentais para a garantia de um melhor atendimento em saúde mental.
“Se é para realocar verbas, elas não devem ser destinadas a hospitais psiquiátricos. Diversas outras modalidades de cuidado poderiam ser desenvolvidas e que ainda não existem no Brasil”, diz Luís Fernando Tofoli, que cita como exemplo o tratamento comunitário assertivo em saúde mental, modelo que tem sido adotado na Europa e que está baseado em tratamentos fora do ambiente hospitalar.
“A literatura indica que esse é o tipo de serviço que mais reduz a necessidade de internação”, defende.
Agência Brasil
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