quarta-feira, setembro 14, 2016

Lula era o 'comandante máximo' do esquema da Lava Jato, diz MPF

Atualizado as 18:25

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou nesta quarta-feira (14) o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a mulher dele, Marisa Letícia, e mais seis pessoas no âmbito da Operação Lava Jato. O procurador Deltan Dallagnol afirmou que, segundo provas do MPF, Lula era o "comandante máximo do esquema de corrupção identificado na Lava Jato"

A denúncia abrange três contratos da OAS com a Petrobras e diz que R$ 3,7 milhões em propinas foram pagas a Lula. Os crimes imputados aos denunciados são corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro. Caberá à Justiça decidir se eles se tornarão réus.

Segundo o procurador, as propinas foram pagas a Lula de forma dissimulada, com a reserva e reforma de um apartamento triplex em Guarujá, no litoral de São Paulo, e com o custeio do armazenamento de bens do ex-presidente. Dallagnol afirmou que há 14 conjuntos de evidência contra o petista, que teria sido o "maior beneficiário do esquema".

A denúncia do MPF diz que todo o mega esquema envolve o valor de R$ 6,2 bilhões em propina, gerando à Petrobras um prejuízo estimado em R$ 42 bilhões.

Veja quem foi denunciado
Luiz Inácio Lula da Silva - ex-presidente - corrupção passiva, ativa e lavagem de dinheiro
Marisa Letícia - mulher de Lula - lavagem de dinheiro
Léo Pinheiro - ex-presidente da OAS - corrupção passiva, ativa e lavagem de dinheiro
Paulo Gordilho - arquiteto e ex-executivo da OAS - lavagem de dinheiro
Paulo Okamotto - presidente do Instituto Lula - lavagem de dinheiro
Agenor Franklin Magalhães Medeiros - ex-executivo da OAS - corrupção ativa e passiva
Fábio Hori Yonamine - ex-presidente da OAS Investimentos - lavagem de dinheiro
Roberto Moreira Ferreira - ligado à OAS - lavagem de dinheiro

A força-tarefa da Lava Jato afirmou que deixou de denunciar Lula pelo crime de organização criminosa porque este fato está em apuração no Supremo Tribunal Federal (STF).

Pelo Facebook, Lula afirmou que desde janeiro deste ano tornou públicos documentos que"provam que ele não é dono de nenhum apartamento no Guarujá", nem "sequer dormiu uma noite" no local.

'Propinocracia'
"O Petrolão era parte de um quadro muito maior", disse Dallagnol, afirmando tratar-se de uma "propinocracia", que seria um governo regido por propinas. Segundo ele, um cartel de empreiteiras conseguia contratos com a Petrobras e pagava valores indevidos a operadores financeiros, funcionários da estatal e políticos. "No centro do núcleo político está o senhor Lula."

“Mensalão e Lava Jato são duas faces de uma mesma moeda”. Segundo Dallagnol, os dois são esquemas de corrupção desenvolvidos por um mesmo governo para alcançar a governabilidade corrompida, perpetuar o PT no poder de forma criminosa e promover o enriquecimento ilícito. "Desta vez, Lula não pode dizer que não sabia de nada."

Dallagnol afirmou que Mensalão e Lava Jato dependiam de duas máquinas para funcionar: uma máquina de governo, por causa das nomeações, e uma máquina de partido, que coletava e adminstrava a propina. "Lula era o elo comum e necessário para as duas máquinas que faziam o esquema rodar."

"Todas as provas nos levam a crer, acima de qualquer dúvida razoável, que Lula era o maestro desta grande orquestra concatenada para saquear os cofres da Petrobras e de outros órgãos públicos. Era o general que estava no comando da imensa engrenagem desse esquema, que chamamos de propinocracia", disse o procurador.

O procurador afirmou que o Petrolão não estava restrito à Petrobras, mas também envolvia a Eletrobras, os ministérios do Planejamento e da Saúde, a Caixa Econômica, entre outros órgãos públicos. A Petrobras era a "galinha dos ovos de ouro do esquema", segundo o procurador, pois a estatal chegou a responder por 75% dos investimentos federais em determinado momento.

Segundo ele, só era possível obter um cargo alto na Petrobras quem aceitasse participar do esquema e receber propina. "A distribuição de cargos no governo era feita, conscientemente, com fins arrecadatórios. Quando Lula assumiu o governo em 2003, tinha apoio de 254 deputados. Após [Lula] adotar uma política de distribuição de cargos, que envolvia mais de 18 mil cargos de confiança, em maio de 2003, a base aliada era composta por 353 deputados."

"Só o poder de decisão de Lula fazia a estratégia de governabilidade corrompida viável. Lula estava no topo da pirâmide do poder, competindo-lhe nomear os altos cargos da administração pública federal. [...] Sem o poder de decisão do Lula, este esquema seria impossível."

O procurador falou sobre o papel do ex-presidente na nomeação de gerentes e diretores da Petrobras, como Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró e Renato Duque, que foram presos na Lava Jato. "Lula nomeou diretores para atender interesses do PP e do PMDB", afirmou.

"Há muitas evidências de que esse esquema era partidário, sendo gerenciado primordialmente pelo Partido dos Trabalhadores", afirmou Dallagnol, citando vários delatores do esquema, como Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef.

O procurador falou sobre o enriquecimento ilícito de pessoas ligadas ao PT, como o ex-ministro José Dirceu, que teria recebido R$ 15 milhões. Com a saída de Dirceu do governo, segundo Dallagnol, a continuidade do mensalão (que virou petrolão) só foi possível porque o ex-ministro não era o líder – e sim alguém acima dele, o ex-presidente Lula.

Apartamento triplex
O procurador Roberson Pozzobon disse que o fato de Lula não figurar como dono do apartamento deGuarujá é uma forma de dissimular a verdadeira propriedade, o que configura lavagem de dinheiro.

“Em se tratando de lavagem de dinheiro, ou seja, em se tratando de uma tentativa de se manter as aparências de licitude, não teremos aqui provas cabais de que Lula é efetivo proprietário no papel do apartamento. Pois, justamente, o fato de ele não configurar como proprietários do tríplex, da cobertura em Guaruja, é uma forma de ocultação de dissimulação da verdadeira propriedade”, afirmou Pozzobom.

Segundo ele, Lula e Marisa tinham comprado cotas do empreendimento da Bancoop e, em 2009, pararam de pagar as parcelas do apartamento 131. Naquela época, a OAS tinha assumido o empreendimento. A família, segundo o procurador, tinha mudado para o apartamento 141. Depois, o MPF encontrou um documento o número do imóvel rasurado. Segundo a perícia, embaixo de 141 estava escrito 174, que era cobertura triplex. Pozzobon disse que a cobertura nunca foi ofertada para venda.

"Eles [Lula e Marisa] receberam a cobertura em pagamento de propina. Ela tem valor de R$ 1,5 milhão, e o valor que eles tinham pago era de R$ 340 mil."

O procurador Julio Noronha afirmou que a OAS realizou uma reforma no apartamento, seguindo o interesse de Lula, conforme indicam mensagens extraídas do celular de Léo Pinheiro.

Armazenamento de bens
A denúncia tem mais de 270 tópicos. Em parte dela, os procuradores afirmam que a autoria de Lula está evidenciada nos pagamentos efetuados pela Construtora OAS em favor da Granero para armazenagem de parte dos bens e pertences pessoais apontados como sendo de propriedade do ex-presidente.

“Soma-se a isso o fato de que os pagamentos da armazenagem dos bens pessoais pertencentes a Lula foi assumida por empresa que se beneficiou diretamente dos ilícitos praticados em desfavor da Administração Pública Federal, notadamente da Petrobras, e tinha uma dívida de propinas com esquema de governo e partidário (era uma das empreiteiras cartelizadas). Além disso, tal empreiteira era controlada por Léo Pinheiro, pessoa muito próxima de Lula”.

De acordo com a Polícia Federal, a OAS pagou por cinco anos (entre 2011 e 2016) R$ 21,5 mil mensais para que bens do ex-presidente ficassem guardados em depósito da empresa Granero. Os pagamentos totalizam R$ 1,3 milhão. Ainda segundo a PF, o montante corresponde a vantagens indevidas pagas pela Construtora OAS em benefício de Lula.

Quanto a Paulo Okamotto, de acordo com os procuradores, também é indiscutível a participação dele nas irregularidades. Foi ele que solicitou à Granero o orçamento para armazenagem dos bens de Lula e, posteriormente, firmou, na condição de presidente do Instituto Lula, apenas contrato para armazenagem do acervo pessoal que necessitava de depósito climatizado".

O que dizem os denunciados
O ex-presidente Lula postou no seu perfil oficial no Facebook: "Desde 30 de janeiro de 2016, Lula tornou públicos os documentos que PROVAM que ele não é o dono de nenhum apartamento no Guarujá. Lula esteve apenas uma vez no edifício, quando sua família avaliava comprar o imóvel. Jamais foi proprietário dele ou sequer dormiu uma noite no suposto apartamento que a Lava-Jato desesperadamente tenta atribuir ao ex-presidente."

O advogado Edward de Carvalho, que defende Léo Pinheiro e Agenor Franklin Magalhães Medeiros, não vai se manifestar. Da mesma forma, o advogado Cal Garcia, que faz a defesa de Fábio Hori Yonamine e Roberto Moreira Ferreira, também não vai comentar a denúncia.

O advogado Fernando Augusto Fernandes, responsável pela defesa de Paulo Okamotto, disse em nota que "não houve lavagem de dinheiro". "O Ministério Público criou uma corrupção em que não há vantagem ilícita. O valor é pago para a conservação de um acervo considerado como ‘patrimônio cultural brasileiro de interesse público’ pela Lei 8394/91. A nota fiscal foi emitida em nome da empresa que contribuiu, a OAS, e não houve qualquer falsidade. O valor foi para a empresa, que mantinha o acervo em depósito."

A defesa de Okamotto criticou ainda a prisão dele e de Lula. "A única lavagem que poderia existir é dos abusos cometidos, da condução coercitiva do presidente Lula e do presidente do instituto, Paulo Okamotto. Abusos que agora se tentam legitimar sem nada encontrar".

Indiciamento
Em agosto deste ano, a Polícia Federal (PF) indiciou Lula, Marisa Letícia, o ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, o arquiteto Paulo Gordilho e o presidente do Instituto Lula Paulo Okamotto por crimes como corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro.

Os cinco foram investigados por supostas irregularidades na aquisição e na reforma de um apartamento triplex do Edifício Solaris, no Guarujá, no litoral de São Paulo, e no depósito de bens do ex-presidente.

Na ocasião, o advogado do ex-presidente e da ex-primeira-dama, Cristiano Zanin Martins, afirmou que o relatório da Polícia Federal "tem caráter e conotação políticos e é, de fato, peça de ficção".

O Instituto Lula e a defesa de Paulo Okamotto informaram que, como não tiveram acesso aos detalhes do indiciamento, não tinham como se pronunciar. Por meio do Instituto Lula, o ex-presidente reiterou que não é proprietário de nenhum imóvel no Guarujá.

Defesa da Lava Jato
No início da entrevista coletiva, o procurador do Ministério Público Deltan Dallagnol apresentou alguns números sobre a Operação Lava Jato e a defendeu de críticas, como a de usar prisões para conseguir acordos de delação premiada. Segundo ele, 70% dos acordos foram conseguidos com investigados que estavam soltos.

Bibiana Dionísio, Isabela Camargo e José ViannaDo G1 PR, da GloboNews e da RPC

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