Durante a manhã, quase 20 deputados executaram a cerimônia de beija-mão do vice, além de seus aliados de sempre -- Moreira Franco,Geddel Vieira Lima, Padilha e o ex-ministro Henrique Alves. Perto das 13 horas, os deputados deixaram a residência oficial para partir rumo ao Congresso Nacional para a sessão que se iniciava às 14 horas. "Michel Temer não estava cantando vitória. Estava sereno, tranquilo e de bom humor, com a família junto dele", disse Baleia Rossi, filho do ex-ministro Wagner Rossi, aliado de Temer. A esposa Marcela e o filho Michelzinho viajaram com Temer de São Paulo a Brasília na manhã de sábado. O vice havia previsto assistir à votação na capital paulista, mas mudou de ideia depois dos rumores de que o governo estaria conseguindo convencer deputados do PP, PR e PSB a mudar votos contra o impeachment. Temer chegou a Brasília às 9 horas da manhã de sábado e deu início a um novo chamamento a deputados. Entre os que passaram por lá, Paulo Maluf (PP-SP), que confirmou voto a favor do impeachment. O ministro das Cidades,Gilberto Kassab (PSD-SP), também se dirigiu à casa do vice depois de entregar o cargo ao governo.
Iniciada a votação, alguns parlamentares mais próximos do vice começaram a deixar o Plenário rumo ao Jaburu após terem votado. Osmar Terra (PMDB-RS) foi um dos primeiros. "Vou lá ver como ele está, pois não fui durante a manhã, com todo mundo", afirmou. Temer mandou seus assessores avisarem os deputados mais chegados que haveria um jantar em sua casa após a votação. Um grupo inferior a 20 pessoas foi convidado. Mas, ao saberem do evento, deputados fora da lista começaram a se prontificar a ir também. "Vai ter jantar? Ah, então vou passar lá para ver como estão as coisas", disse o deputado Fabinho (PMDB-MG).
Fabinho é um entre muitos deputados ansiosos para se aproximar de Temer. Nos últimos meses, o vice redobrou seus esforços para se mostrar aberto e atencioso aos congressistas -- tanto os poderosos quanto os miúdos.
O ESTILO TEMER DE NEGOCIAR
O deputado maranhense Juscelino Filho é médico, está no primeiro mandato e mudou-se do PRP para o DEM em março, com o fim da janela partidária. É o típico representante do baixo clero do Congresso Nacional. Quase ninguém o conhece. Entre os poucos, está Temer. Juscelino Filho era um dos mais de 100 parlamentares na romaria até o Palácio do Jaburu ao longo da semana passada, desde que o resultado da comissão de impeachment se mostrou desfavorável Dilma. O relógio marcava 20h26 da segunda-feira, 11, dia da votação da comissão, quando os telefones do Jaburu começaram a tocar.
Bastou o vice sinalizar que estava aberto para visitas que filas de carros passaram a se formar na entrada de sua casa, num entra e sai que começava de manhã e só terminava à noite, por volta das 20 horas. Houve de tudo um pouco: de ilustres desconhecidos como Juscelino até o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani, que costurava no Jaburu uma saída para que seu rito de abandono do governo não soasse tão desonroso, mesmo para os padrões fluidos do partido.
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Temer, de 76 anos, recebeu a todos de aparente bom humor, com um leve sorriso no rosto, percebido não tanto pelos lábios, quase sempre cerrados, mas pela expressividade de seus músculos da face. Um sorriso que não mostra nada em demasia. Tentou chamar um a um pelo nome e evitou falar sobre o governo atual ou criticar Dilma abertamente na presença dos novatos. Preferia falar em propostas para o futuro e insistia na ideia de “união”. Quando não estava falando com as bancadas em seu escritório, estava ao telefone. Na maioria das vezes, em ligações para São Paulo, onde estão sua família e alguns de seus principais interlocutores.
No Jaburu, terminadas as conversas, o vice procurava acompanhar todo visitante até a porta de saída e oferecia jantar aos mais chegados, como o ex-deputado Geddel. Na terça-feira, visitou o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) para um jantar com a velha guarda do partido. Foi acompanhado do senador Romero Jucá (PMDB-RR) e de Eliseu Padilha. Durante o jantar, não se acanhou em falar de suas últimas movimentações. Afirmou que tentou se distanciar dos fatos, em São Paulo, mas que sua permanência fora de Brasília abria espaço para que se intensificassem os ataques a sua imagem. “Não queria me amedrontar”, disse Temer.
O vice parece tudo, menos amedrontado. Enxerga-se em suas palavras e atitudes a determinação de quem quer governar. Noáudio de um discurso escrito para o momento pós-impeachment, que ele diz ter divulgado por engano, há um encadeamento de ideias bem edificado e com público-alvo definido: a classe política, o mercado e, por último, a população temerosa do fim dos programas sociais que levam a assinatura do PT, em especial o Bolsa Família. “É preciso um governo de salvação nacional e, portanto, de união nacional”, disse Temer, pouco antes de se dirigir ao empresariado e falar na necessidade de “prestigiar a iniciativa privada”. No jantar na casa de Vasconcelos, no dia seguinte à divulgação do áudio, o vice disse, em leve tom de brincadeira, que o discurso enviado a deputados por WhatsApp foi um acidente de percurso. “Vocês podem não acreditar, mas foi sem querer.” O argumento não foi acatado prontamente devido ao comportamento do vice, sempre meticuloso, calculista e prudente.
Quando foi por duas vezes presidente da Câmara dos Deputados, Temer sempre chegava a Brasília na segunda-feira à noite, antes da maioria dos parlamentares. Preferia chegar mais cedo para não ser pego de surpresa por nenhum contratempo em dia de sessão. Metódico, saía do aeroporto para jantar no restaurante Piantella, onde preferia sanduíches e quase não pedia vinho. Temer bebe pouco, mas fuma charutos de vez em quando. “Ele não gosta de nada que o faça sair de controle. Até por isso está sempre apertando as próprias mãos, como se fosse uma forma de extravasar”, diz um deputado peemedebista que o conhece de longa data.
Em jantares íntimos, em sua casa, na parte nobre do bairro de Pinheiros, em São Paulo, o vice segue uma liturgia com os convidados. Na primeira visita, o tratamento é muito formal, sem espaço para brincadeiras. A formalidade se rompe a partir do segundo ou terceiro encontro, a depender da harmonia do ambiente. Piadas entram no cardápio, mas jamais com palavras de baixo calão.
O deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) se recorda de jantares agradáveis em companhia do vice-presidente no Piantella e na residência oficial. Em seu último encontro com ele, no final de 2015, no Jaburu, Teixeira se lembra de terem conversado sobre o livro Sapiens – Uma breve história da humanidade, de Yuval Harari, recém-traduzido para o português. “Ele consegue ser formal sem ser chato. Fala muito de literatura, mas sempre de uma forma humilde, sem impor seu conhecimento nem tentar se valer de uma imagem intelectualizada”, afirma.
Temperança é uma palavra que o próprio Temer gosta de usar para definir sua personalidade, sempre serena, como se liberta de qualquer tipo de aflição. O oposto de Dilma, cujos arroubos são célebres. Esse é o maior trunfo do vice, segundo aliados e até petistas, para lidar com o Congresso. O senador Paulo Rocha (PT-PA) reconhece a calma quase excessiva de Temer como ferramenta de construção de consenso. “Ao manter sempre uma conduta pacífica, ele saiu da linha de tiro, sobretudo no PMDB. Por isso se manteve tanto tempo na presidência do partido”, diz.
A conduta cordial do peemedebista se evidenciou no período pós-manifestações de 2013. Um grupo de médicos ligados ao PMDB ofereceu apoio na elaboração de projetos de saúde pública que pudessem ajudar a acalmar a população. Não deu em nada. Mas o deputado Osmar Terra (PMDB-RS), que acompanhou o episódio, relata que os médicos receberam maior deferência de Temer do que do ministro da Saúde ou do assessor designado para atendê-los.
Contudo, o vice-presidente também tem seus dias de fúria. Um aliado conta que, em 2011, quando Dilma fazia sua faxina ministerial, um alvo era o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, ligado a Temer. O então chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, ligou para o vice alterado, para avisar que o ministro seria derrubado devido a irregularidades encontradas em sua Pasta. Temer subiu o tom de voz, lançou um palavrão e disse que ele se encarregaria de Rossi. O ministro seguiu a orientação do “padrinho” e se demitiu no dia seguinte. Mais recentemente, o vice reagiu após seu aliado, o o senador tucano José Serra (PSDB-SP), dar declarações à imprensa sobre um hipotético governo Temer. Ele ligou para Serra para criticá-lo pela saia justa e enviou uma carta aos veículos de comunicação dizendo que não autorizava ninguém a falar em seu nome. A briga durou pouco. Serra e Temer continuam conversando, cada dia mais.
A construção de um governo Temer, se o impeachment se confirmar, dependerá da capacidade do vice de empregar seus talentos para negociar e delegar. Padilha, que há quase 30 anos trabalha com ele no Legislativo, é um dos braços mais ativos de Temer. Ele coordena o mapa de votos do impeachment e o compartilha com o vice. Já o ex-ministro Moreira Franco, que dirige a Fundação Ulysses Guimarães, funciona como consultor político de Temer. Também estão a seu lado os ex-deputados Sandro Mabel e Geddel Moreira Lima e o publicitário Elsinho Mouco.
Todos devem permanecer com Temer na hipótese de novo governo. Contudo, têm sido questionados nas conversas de outros deputados com o vice, sobretudo pelo fato de Mabel pertencer ao círculo próximo de Eduardo Cunha. Seria constrangedor colocá-lo no governo. ÉPOCA ouviu deputados e senadores do PMDB e de partidos a favor do impeachment que têm sinalizado ao vice a necessidade de compor um time diferente, não necessariamente integrado por aliados históricos. O problema, pondera um deles, é que delega muito, mas só para um pequeno grupo. Um presidente precisa conseguir confiar e trabalhar com um círculo mais amplo.
Na economia, um governo Temer encontraria um desafio. Ele não chegou a fazer nenhum convite concreto para o Ministério da Fazenda e o Banco Central. Seus aliados avaliam mudanças imediatas que possam melhorar as expectativas econômicas, mas admitem que bons resultados reais demorarão de seis meses a um ano. Também não tem plano de tornar o BC independente. Para o Ministério da Fazenda, pensa-se em um nome mais próximo à academia ou ao mercado financeiro.
>> Como o abalo no cenário político muda o cenário econômico04:00
Num eventual governo, as primeiras tentativas de mudança seriam no sistema de exploração do pré-sal, com a adoção do regime de concessão, e regras para infraestrutura, como portos e aeroportos. O plano é desencadear uma onda de privatização – embora o peemedebista tenha evitado essa palavra em sua proposta pública de governo, no documento Uma Ponte para o Futuro. Seus assessores gostariam de demonstrar segurança jurídica e atrair mais capital para o mercado brasileiro. Temer afirma pretender cortar ministérios e cargos comissionados. Um corte significativo daria uma boa impressão de seu governo e ajudaria a conter o deficit público. Ele descarta qualquer intenção de reajustar ou criar tributos, caso venha a ocupar a Presidência da República. Temer vem mostrando muito talento para dizer o que todos esperam ouvir.
Todos devem permanecer com Temer na hipótese de novo governo. Contudo, têm sido questionados nas conversas de outros deputados com o vice, sobretudo pelo fato de Mabel pertencer ao círculo próximo de Eduardo Cunha. Seria constrangedor colocá-lo no governo. ÉPOCA ouviu deputados e senadores do PMDB e de partidos a favor do impeachment que têm sinalizado ao vice a necessidade de compor um time diferente, não necessariamente integrado por aliados históricos. O problema, pondera um deles, é que delega muito, mas só para um pequeno grupo. Um presidente precisa conseguir confiar e trabalhar com um círculo mais amplo.
Na economia, um governo Temer encontraria um desafio. Ele não chegou a fazer nenhum convite concreto para o Ministério da Fazenda e o Banco Central. Seus aliados avaliam mudanças imediatas que possam melhorar as expectativas econômicas, mas admitem que bons resultados reais demorarão de seis meses a um ano. Também não tem plano de tornar o BC independente. Para o Ministério da Fazenda, pensa-se em um nome mais próximo à academia ou ao mercado financeiro.
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