Fotos: Carolina Castro Fotógrafa
A fotógrafa mineira Carolina Castro criou um projeto que tem como objetivo fazer com que meninas de cabelos crespos tenham cada vez mais autoestima para se assumirem como são. É o "Alisa não, mãe". Ela conta que a ideia surgiu quando uma conhecida dela disse que não gostava dos cabelos crespos da filha. "Ela, a mãe, havia sofrido muito na infância e adolescência com preconceitos e não queria que a filha passasse pelo que ela passou. Era fácil perceber que logo que essa criança crescesse um pouco a mãe alisaria o cabelo dela. Não a julgo, ela iria agir movida sempre pela boa intenção de mãe. Mas eu sentia que precisava fazer algo a respeito, pois essa não era a única criança que vivenciaria isso", conta.
Carolina começou então a procurar na Internet grupos de mulheres crespas e cacheadas que falassem a respeito de tratamentos para cabelos. Foi quando descobriu um universo de mulheres que estavam se libertando da ditadura do liso. "Muitas, ou a maioria, têm dificuldade de aceitar e assumir o cabelo naturalmente e acredito que isso seja consequência de um estereótipo muito distante da realidade da mulher brasileira, mas que é imposto. Toda vez que via um antes e depois daquelas mulheres eu ficava encantada, elas eram infinitamente mais bonitas com o cabelo natural. Queria mostrar isso", diz.
Valorização dos cabelos crespos
Com a ajuda de uma amiga, buscou na cidade onde mora (Araxá, em Minas Gerais) meninas com cabelo cacheado, crespo, trançado, afros em geral, para uma sessão de fotos. Não houve pré-seleção, a única restrição era que não tivessem o cabelo alisado. Depois das fotos prontas, publicou um álbum em sua página no Facebook e teve mais de quatro mil curtidas e quase dois mil compartilhamentos. "Queria fazer bem àquelas crianças e presenteá-las com as fotos, dizer que elas são lindas como são e que não precisavam se adequar a um padrão. Não tinha intenção que viralizasse como aconteceu", explica.
Ela conta que, depois da publicação, recebeu inúmeros relatos de mães dizendo que não só passaram a valorizar o cabelo das filhas, como também decidiram por abandonar a química e voltar às origens. "Muitas estão empolgadíssimas, querem ser o exemplo para as filhas. E muitas idéias surgiram a partir do projeto, muitas pessoas têm me procurado perguntando se podem copiar e a ideia é exatamente essa, que em vários lugares do país essa bandeira seja levantada. Eu continuarei usando o que tenho em mãos, que é a fotografia, pra fortalecer e empoderar muitas crianças por onde eu passar", diz.
Depoimentos das mães
Carolina agradeceu a cada uma das mães envolvidas no projeto e citou que apenas quatro em cada 10 meninas cacheadas acham seus cabelos bonitos e que elas são sete vezes mais propensas a amarem seus cachos se as pessoas ao seu redor os amarem também. Ela publicou ainda alguns depoimentos das mães:
"Minha filha sempre sofre preconceito na escola, muitas vezes da mesma coleguinha que diz que ela tem cabelo de bombril, que é duro, que deve lavar com shampoo de laranja, porque tá um bagaço, essas coisas de criança…"
"Eu não lembro, direito, mas minha minha mãe conta que uma prima mais velha falou de mim com vergonha para a amiga, disse que eu andava igual mendiga, descabelada. Minha mãe disse que eu cheguei em casa e perguntei o que era mendiga."
"Vivem dando nomes diferentes pro meu cabelo: Cabelo de tufu, cabelo de arapia. Mas o que é arapia? É tipo uma teia de aranha, preta."
"Minha professora se incomodava em ver eu e uma amiga que tem o mesmo ‘estilo’ de cabelo que o meu, e fazia críticas em tom de ironia: Amarra esse cabelo pra gente continuar nossa aula!"
"Minha filha foi escolhida pra ser a Branca de Neve na apresentação da escola no ano passado, mas as pessoas falaram o tempo todo em tom de brincadeira que ela era a Preta de Neve."
"Eu sempre tive muita dificuldade com meu cabelo. Até hoje fico com receio de andar com ele livre, sem encharcar ele de creme e água."
"Minha filha nunca tinha sido chamada pra ser dama de honra de um casamento, eu sei que é devido ao fato dela ser negra e ter o cabelo bem afro, não fazia o estilo pra uma dama de honra. Nós sentíamos muito, ela também sentia, eu sei. Recentemente o motorista da van que a leva pra escola a convidou pra entrar no casamento dele, justamente por ser como ela é. Ela chorou, e entrou lindamente no casamento de noivinha e com o cabelão solto, black power. Naquele momento ela representou todas as meninas negras que não têm espaços. E as fotos do projeto têm o mesmo objetivo, representar as crianças como ela, que muitas vezes são deixadas de lado porque são como são."
Por Mariana Bueno/Bolsa de Mulher
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