A ideia é que os equipamentos eletroeletrônicos, ao serem desmontados, tenham suas peças encaminhadas para indústrias de reciclagem.
Ao final da vida útil de eletroeletrônicos (computadores, aparelhos celulares e geladeiras), o consumidor deve devolvê-los ou aos fabricantes, ou aos importadores ou aos comerciantes para que esses equipamentos tenham uma destinação adequada. Este procedimento, chamado de logística reversa, está previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), lei 12.305 aprovada em agosto de 2010 pelo Governo Federal mas ainda não implantada. O processo de implantação desta logística foi o tema pesquisado pela gestora ambiental Erika Tatiane Ferreira Yura em sua dissertação de mestrado pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP.
“Para ser implantada, a Política precisa, primeiro, ser regulamentada. Enquanto o governo federal não fizer os ajustes necessários, o acordo setorial entre comerciantes, produtores e a indústria não será assinado. É preciso ainda resolver algumas questões jurídicas que depende da participação de múltiplos Ministérios Federais”, aponta a pesquisadora.
Segundo Erika, nos últimos anos, os atores deste acordo setorial têm se reunido com o objetivo de determinar exatamente como vai funcionar a implantação da logística reversa e qual será a responsabilidade de cada um deles.
Equipamentos eletrônicos possuem, em sua composição, elementos tóxicos como mercúrio, chumbo, cromo, cádmio ou arsênio. Devido a isso, a desmontagem precisa ser feita com cautela pois pode contaminar seres humanos e o meio ambiente. A ideia é que os equipamentos eletroeletrônicos, ao serem desmontados, tenham suas peças encaminhadas para indústrias de reciclagem.
Erika conversou com pessoas ligadas a cooperativas de reciclagem, representantes da indústria, do comércio e do governo, totalizando entrevistas com 9 gestores. Esses dados foram inseridos em um software de análise de discurso, o Classification Hiérarchique Classificatoire et Cohésitive – (CHIC®), e que permitiu categorizar essas informações e mostrar os principais pontos do discurso desses atores.
Das 9 entrevistas, 4 concordam que a responsabilidade compartilhada é a forma mais justa para tratar o tema. Um deles apontou que há um “sombreamento de responsabilidades”, ou seja, não está definida qual é a responsabilidade de cada um dos envolvidos, e que caberia ao governo resolver isso.
Entraves
Érika explica que um dos pontos a serem resolvidos é a necessidade de definir um documento padrão que ateste a não periculosidade do produto até a desmontagem. “É preciso ainda um documento autodeclaratório de transporte transestadual; a isenção de imposto desses resíduos, tanto para a indústria como para o comércio; a padronização de um documento de reconhecimento de perda de propriedade pelo produto a ser assinado pelo proprietário. Também é necessário definir como será feita a tributação da logistica reversa, pois dependendo da forma como é feita, o consumidor pode ser tributado duas vezes”, diz.
Outro ponto é o fato de a PNRS citar, em vários momentos, a participação de cooperativas de reciclagem. Érika lembra da necessidade de um treinamento específico para a desmontagem de eletroeletrônicos. A Escola Politécnica (Poli) da USP e o Instituto GEA Ética e Meio Ambiente desenvolvem o Projeto Eco-Eletro, que capacita catadores de cooperativas para a desmontagem segura e rentável de computadores. Entretanto, a pesquisadora desconhece cooperativas que trabalhem com a desmontagem segura de geladeiras e outros tipos de eletroeletrônicos.
A questão dos equipamentos órfãos (ilegais) é outro entrave. “O governo diz que eles podem ser absorvidos pela cadeia; já a indústria e comércio dizem que não são responsáveis pelos custos dessa logística”, destaca. “A mesma situação ocorre quando se trata da participação das cooperativas: elas dizem não receber nenhum tipo de ajuda do governo; a indústria e comércio dizem que este ponto não é de responsabilidade deles.”
Situação atual
Em fevereiro de 2013, o governo federal lançou um edital para elaboração de um acordo setorial para a implantação da logística reversa, mas o acordo estacionou nessas questões. No último mês de janeiro, foi encaminhado um documento com uma proposta de acordo setorial ao Ministério do Meio Ambiente, que devolveu com algumas recomendações e orientações. Após audiências realizadas em fevereiro e março de 2015, o acordo aguarda, atualmente, a resposta dos outros Ministérios envolvidos. “A partir de um marco regulatório, a PNRS vai gerar demandas e adequações a todos os envolvidos. E a participação dos consumidores vai ser fundamental para que o projeto dê certo”, finaliza.
A pesquisa Processo de implantação dos sistemas de logística reversa de equipamentos eletroeletrônicos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos: uma visão dos gestores foi apresentada em setembro de 2014 na FSP, sob a orientação da professora Maria Regina Alves Cardoso.
Por Valéria Dias, da Agência USP de Notícias, in EcoDebate
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