sexta-feira, julho 24, 2015

Após um mês preso por roubar três picolés, homem consegue liberdade

Caso aconteceu na pequena cidade de Conchal, no interior de São Paulo; o acusado é um homem negro e morador da região mais pobre da cidade, e era réu primário.  (Foto: Reprodução Google Maps)

Depois de um mês preso, um homem conseguiu na Justiça um habeas corpus para responder em liberdade pelo crime de furto. O detalhe é que o rapaz, que não teve a identidade revelada, havia sido detido em flagrante por roubar três picolés de uma loja da pequena cidade de Conchal, no interior de São Paulo. Durante 30 dias, o suspeito esteve preso em uma cela compartilhada com outros detentos, alguns deles que respondem por crimes como roubo a mão armada e até crimes hediondos, custando aos cofres públicos mais de R$ 2 mil — preço médio do custo mensal de cada detento no sistema carcerário paulista —, pelo furto de mercadorias que, somadas, custam R$ 19,50.

A manutenção do acusado na prisão foi considerada desproporcional pelo desembargador Otávio de Almeida Toledo, da 16ª Câmara de Direito Criminal de São Paulo, que deferiu pedido de habeas corpus feito pela defensora pública Bruna Rigo Leopoldi Ribeiro Nunes. Na decisão, o julgador considerou a quantia do furto insignificante para sustentar o pedido de prisão preventiva. “O suposto delito do caso em tela envolveu o furto de quantia insignificante para ensejar a [prisão] preventiva. Assim, existem inúmeras medidas cautelares que podem ser utilizadas para sanar supostos riscos vislumbrados pela liberdade do agente, e que devem ser preferidas à prisão, por expressa disposição legal”, diz Almeida Toledo, no texto.


O acusado — um homem negro e morador da região mais pobre da cidade — era réu primário. Para a defensora Bruna Nunes, a prisão dele é um retrato do sistema judiciário brasileiro, que vê a prisão como a principal solução para resolver os problemas da sociedade. Considerando a prisão desproporcional, a defensora convenceu o desembargador de conceder a liberdade ao suspeito.

— O indiciado era primário, não tinha nenhuma passagem pela polícia e mesmo assim foi levado e ficou preso por mais de um mês, por causa de três picolés. Não tem proporcionalidade manter presa, num sistema como o nosso em que cada preso custa mais de R$ 2 mil aqui no estado de São Paulo, uma pessoa que é acusada de um furto que não chega a R$ 20 — explica Bruna.

Para a defensora, a decisão tomada inicialmente é reflexo da sociedade que cobra por prisões. Ela descreve ainda a desigualdade como as pessoas são julgadas, de acordo com raça ou classe social.

— Acho que as pessoas que julgam refletem o que pensa a sociedade. É a ideia de que as pessoas devem ser presas, punidas, sofrer por aquilo que elas cometeram. Mas é interessante que essas pessoas presas são sempre pobres, como o indiciado em questão. Um jovem negro, que mora na periferia. Para as pessoas que cobram por prisões, o sistema penitenciário resolve tudo. Pedem prisão, mas sempre pros outros — opina.

O indiciado está proibido, por determinação do desembargador, de ter contato com as supostas vítimas do furto e deve pedir autorização para sair da cidade de Conchal. A cidade, por sua vez, não tem unidade da Defensoria Pública. O caso só chegou à equipe de defensores localizada na capital porque eles assumem os casos registrados na Central de Flagrantes, de pessoas que não têm condições de contratar advogados particulares.

Extra-RJ

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