Bioma tem fontes de proteínas, têm ação anti-infecciosa e podem ser usados em cosméticos
Quando se fala em Caatinga, vegetação típica do semiárido nordestino, a imagem que vem logo à cabeça é frequentemente associada com a seca, pobreza e pouca biodiversidade. Mas, ao contrário do que se pensa, esse bioma é um verdadeiro “tesouro biológico”. As plantas dessa vegetação são fontes de proteínas bioativas, óleos de plantas que podem ser usados no tratamento do câncer, por exemplo. Também têm poder anti-infeccioso, podendo ser usadas na produção de antibióticos. Além disso, têm compostos que podem ser adicionados à fórmula de cosméticos.
Em busca do uso da biotecnologia a partir do bioma, estudos vêm sendo feitos, desde 2009, pelas universidades federais de São Paulo, Bahia, Rio Grande do Sul e do Estado. Em Pernambuco, o Departamento de Bioquímica da UFPE estuda novos antibióticos a partir do extrato de plantas, como ouricuri e angico, para combater bactérias resistentes. A pesquisa, que vem sendo desenvolvida há quatro anos, é em cima de mais de cem tipos de planta, todas colhidas no Parque Nacional do Vale do Catimbau, em Buíque, no Agreste pernambucano. As espécies estão isoladas no laboratório de produtos naturais para tratamento de bioquímicos da universidade.
“A Caatinga é um bioma rico, mas pouco conhecido. Precisamos definir uma política pública que volte os olhos para essa vegetação”, ressalta a professora do Departamento de Bioquímica da UFPE Márcia Vanusa da Silva, que está coordenando o VI workshop sobre o Potencial Biotecnológico da Caatinga.
Durante o evento haverá capacitações voltadas para purificação de proteínas, extração e purificação de compostos bioativos e técnicas de coleta e identificação botânica. Professora de Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP), Camila Areias de Oliveira vai destacar o uso da rutina em preparações de filtros solares.
Geralmente, encontrada em árvores de pequeno e médio portes do cerrado e da caatinga, a substância tem ação antioxidante, valorizada na indústria por ser conhecida como fator antienvelhecimento celular, além de oferecer mais proteção solar, prevenindo contra os danos causados pelos raios ultravioletas. “Melhoramos sua incorporação de maneira esteticamente viável e funcionalmente mais atrativa por meio da partícula de gelatina. Por combater o envelhecimento das células, a rutina é muito mais eficaz contra a radiação ultravioleta em relação aos protetores solares vendidos no comércio”, explica a pesquisadora.
Já a função antimicrobiana dos extratos da casca e raiz de espécies como canzenzo e apuleia, por exemplo, será abordada pelo pesquisador do Centro de Biotecnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Alexandre José Macedo. “A partir do potencial dessas plantas é possível desenvolver materiais hospitalares anti-infecciosos. Os catéteres, por exemplo, são feitos hoje a partir de um plástico em que, facilmente, se acumula uma ‘camada bacteriana’, que nem anticorpos são suficientes para exterminá-la”, exemplifica.
Conservação - A conservação da “Mata Branca”, como é conhecida a Caatinga, foi um ponto reforçado por Márcia Vanusa. De acordo com ela, além dos potenciais biotecnológicos, a vegetação evita a emissão do gás carbônico e é responsável por outros benefícios ambientais, como a conservação da água e do solo. “A Caatinga é fonte de matérias primas como frutos silvestres, forragem, fibras e plantas medicinais, e precisa ter um cuidado maior do poder público”, clama a pesquisadora. De acordo com o World Wide Fund for Nature, organização não governamental internacional que atua nas áreas da conservação, investigação e recuperação ambiental, a Caatinga compreende quase 10% da área total do território brasileiro, com aproximadamente 740 mil quilômetros quadrados. Atualmente, mais da metade dela está devastada.
Estiagem - No idioma Tupi, Mata Branca faz referência à vegetação sem folhas que predomina durante a época de seca. Para suportar a estiagem, algumas espécies de plantas possuem reservas de água em seus tecidos. A barriguda, por exemplo, armazena líquido no tronco. O umbuzeiro, por sua vez, guarda nas raízes.
Por Priscilla Costa, da Folha de Pernambuco
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