Mais de 200 operários do ramo petrolífero, contratados por uma emprega terceirizada, para atuarem no município de Passo de Camaragibe, no Litoral Norte de Alagoas, estão sendo submetidos a situação degradante de trabalho. Auditores fiscais da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) em Alagoas e integrantes do Ministério Público do Trabalho (MPT) averiguaram a denúncia feita pelo sindicato da categoria e constataram, também, que, entre os trabalhadores, estavam um grupo de argentinos que foi aliciado a vir ao estado com a promessa de manter um alto salário, mas foi enganado e nem os acordos trabalhistas foram pagos.
O assunto está sendo tratado, hoje, durante uma audiência entre o MPT e os representantes da empresa. A intenção é agilizar o pagamento destes trabalhadores e devolvê-los para casa. A procuradora do Trabalho Virgínia Ferreira pode, inclusive, ingressar com uma ação trabalhista para forçar o cumprimento da lei.
Os argentinos estavam prestando serviço no Mato Grosso, pela empresa ANDL, quando foram transferidos para o município alagoano de Passo de Camaragibe, tiveram os salários reduzidos e não mais puderam enviar dinheiro para as famílias. Há 15 dias eles concluíram os trabalhos em Alagoas e foram trazidos para Maceió. Desde então, aguardam o pagamento dos valores devidos pela empresa.
"Nossa família está na Argentina sem ter o que comer. Estamos há cinco meses sem enviar um 'peso' para eles. Queremos o dinheiro que a empresa nos deve e a passagem para voltar para casa", afirma um dos argentinos, Sandro Urra, pai de dois filhos.
Os trabalhadores contam que a promessa, ao serem trazidos para Passo de Camaragibe, era a de que eles continuariam recebendo uma remuneração de R$ 5.500, a mesma que estavam recebendo no Mato Grosso. Ao chegarem a Alagoas, foram surpreendidos com um salário de apenas R$ 1.200 - que é o que consta na carteira de trabalho, o valor bruto, sem gratificações.
Pela proposta, a jornada de trabalho a ser cumprida pelos profissionais seria de 45 dias de serviço e 15 de folga, para visitar a família no país vizinho, mas eles contam que trabalharam durante 132 dias seguidos, sem nenhum dia de descanso.
"Eu tenho dois filhos e meu pai está com câncer, precisando de medicamentos. Além de estar longe, também não tenho dinheiro para enviar", afirma Martín Arrieta, de 34 anos.
"Meu filho estava estudando na universidade e teve que sair porque não está pagando a mensalidade", completa Julio Tolay.
Inicialmente, o número de argentinos que veio para Maceió era de 16. Três deles já deixaram a casa que foi alugada pela empresa, situada no bairro da Pajuçara. Diante de tantas incertezas, um deles foi embora por conta própria. Outros dois aproveitaram que o carro da empresa precisaria ser levado para a fronteira e ficaram por lá.
"A única coisa que estamos conseguindo aqui é perder a família. Dizemos que vamos voltar hoje, amanhã e esse dia nunca chega. Também não podemos chegar lá de mãs vazias depois de tanto tempo longe", diz Martín Orluzuskas.
Pelas contas já feitas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, os trabalhadores têm direito a receber, juntos, mais de R$ 260 mil.
Grupo foi montado para acompanhar a questão
De acordo com o auditor do Trabalho Leandro Carvalho, no dia 15 de abril deste ano, uma ação fiscal foi feita no intuito de averiguar as condições destes trabalhadores. A denúncia feita pelo Sindicato dos Petroleiros de Alagoas dava conta de que os operários estavam sendo submetidos a situação degradante de trabalho e que a maioria era de outras partes do Brasil – e até do exterior. Eram migrantes da Bahia, Maranhão e Mato Grosso e imigrantes da Argentina, além de muitos alagoanos.
Um grupo de trabalho foi montado com a participação de integrantes da SRTE, do MPT, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Exército. Os policiais foram chamados para fazer a segurança da equipe e os militares, para observar a questão dos materiais usados pelos trabalhadores durante o serviço.
Quando os fiscais foram até a cidade de Passo de Camaragibe perceberam que os trabalhadores estavam alojados em situação precária, ao ponto de 20 pessoas dormirem em dois quartos pequenos (de maneira improvisada). Havia até beliches na cozinha.
“Existe uma concessão de blocos para extração de petróleo e gás e a empresa G3 ganhou a licitação, mas é de se desconfiar que essa empresa só tem 13 empregados registrados em todo o Brasil. O processo licitatório seria para exploração na bacia Alagoas/Sergipe. No entanto, a G3 terceirizou os serviços com outra empresa, a ANDL Geofísica Ltda, que é brasileira, mas tem capital e diretores na Argentina”, explicou Carvalho.
Ele relatou que a ANDL trouxe os trabalhadores da Argentina para o Brasil. Além disso, ainda absorveu operários de outras partes do País. “O grupo de trabalho envolvendo a SRTE e o MPT fez um Termo de Ajustamento de Conduta obrigando a G3 a fazer a quitação da verba rescisória dos trabalhadores e mandá-los de volta aos seus locais de origem. As duas empresas não se entenderam e ontem chegou a denúncia de que os trabalhadores argentinos estavam na mesma situação. Eles não receberam os pagamentos das verbas rescisórias e havia fortes indícios de aliciamento. Além disso, eles não tinham como voltar para a Argentina. Na prática, eles foram trazidos com falsas promessas”, relata.
Empresa não depositava nem o FGTS
De acordo com o fiscal do Trabalho, a empresa que venceu a licitação é a única que está sendo responsabilizada. Entre as irregularidades cometidas contra os trabalhadores estão o não pagamento das rescisões de contrato, do FGTS, pagamento por fora do que é expresso no contracheque, a submissão a péssimas condições de saúde e segurança no trabalho e aliciamento. “Estamos diante de uma situação limite da legislação trabalhista, condições, inclusive, análogas de escravo, previstas no artigo 149, do Código Penal”, explica.
Ainda conforme a SRTE, a ANDL está impedida de participar de concorrências públicas desde o ano passado, quando deixou cumprir questões trabalhistas no Mato Grosso. Desde que começaram a atuar neste caso, os fiscais conseguiram que mais de 70 trabalhadores voltassem para casa.
Gazeta Web
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