Lago de Sobradinho é 14 vezes maior que a Baía de Guanabara (RJ) e está com apenas 17% do volume. Cidade inundada voltou a aparecer em ruínas.
Exércitos de caminhões-pipas tentam amenizar o problema, poços são perfurados em busca de água e até uma cidade que foi inundada nos anos 70 para a criação de uma hidrelétrica reapareceu por causa da seca.
O maior de todos os reservatórios de água do Nordeste está secando. O Lago de Sobradinho tem 380 quilômetros de extensão e capacidade para armazenar 34 bilhões de metros cúbicos de água. Quatorze vezes maior que a Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro. É o mar do sertão.
Mas o volume atual do Lago de Sobradinho é de apenas 17%. A régua com os números na parede da barragem comprovam que o nível está baixando cada vez mais.
A barragem foi construída no Rio São Francisco, para gerar energia elétrica e abastecer o Nordeste. No enchimento do lago, em 1974, cinco cidades baianas foram alagadas. A população foi transferida para novas cidades, com os mesmos nomes: Pilão Arcado, Remanso, Casa Nova, Sento Sé e Sobradinho.
Com a seca atual, o lago recuou 6 quilômetros, entre a nova e a velha Remanso, deixando o chão rachado e apenas algumas poças de água, que são aproveitadas pelas aves e pelo gado.
A cidade inundada há 40 anos com a formação do Lago de Sobradinho, voltou a aparecer agora, em ruínas. Só restou a Estação de Tratamento de Água da cidade. Em um local, o nível da água passava a 7 metros de altura, cobrindo completamente a velha Remanso.
Antigos moradores estão visitando o que restou da terra onde nasceram. Seu Everaldo levou o Fantástico para lembrar como era a cidade.
“Tinha dia que você não encontrava um espaço em frente à cidade, para encostar uma barca pela importância de toda hora chegar barcas diferentes. O grande forte do Remanso mesmo era ser o porto da cidade e também da região do interior”, conta o carpinteiro Everaldo Muniz.
Do alto da caixa d’água é possível ver o que resta da cidade. Por fotos é possível ver como era o ancoradouro antes da formação do lago. A igreja matriz, que também ficou em ruínas e o mercado municipal.
"Na época da nossa cidade antiga, o mercado tinha uma arquitetura até moderna para sua época. Só mesmo quem viveu aqui é que sabe a emoção que a gente passa, quando pisa aqui na terra natal”, diz Marcílio Braga, produtor de eventos.
De Remanso partem centenas de carros-pipa para abastecer outras cidades e a zona rural. Pelos dados do Exército, que controla a distribuição da água, são 6,5 mil carros-pipa. No Piauí, foram abertos poços particulares com capacidade de armazenar 480 mil litros. O Exército, que tem o controle da extração e transporte da água, garante que as contas estão em dia. Mas os caminhoneiros reclamam da falta de pagamento.
"Tudo atrasado. Em janeiro, saiu outubro e novembro. E aí não saiu mais dinheiro não. Essa aqui é a última carrada do mês de março sem receber", conta o caminhoneiro Lindomar Medeiros.
O Fantástico registrou um caminhão saindo para a cidade de Fartura do Piauí, a 130 quilômetros de distância. As estradas estão lotadas de carros-pipa, que chegam a ultrapassar pelo acostamento. Cometem infrações, na pressa de entregar a água.
No Parque Nacional da Serra da Capivara, que tem a maior concentração de fauna da caatinga, um poço com 800 metros de profundidade fornece a água para abastecer pequenos reservatórios no meio da mata. Só para consumo dos animais.
Montanhas de Arenito, no sertão do Piauí, com a vegetação completamente verde. A região fica com essas caracterísitcas, porque choveu nos últimos dias. E por lá, uma casa típica do interior do Nordeste. A diferença é uma calha, de aproveitamento da água. Quando chove, a água passa pela calha e vai para uma cisterna, ao lado da casa. Dona Raimunda mora sozinha na casa. Os habitantes da área, tão isolada, partiram. Mas a moradora solitária vai ficar enquanto tiver água: "Se não tivesse essa água aqui, eu não tava mais aqui não. Já tinha ido embora”, diz a agricultora Raimunda Santos da Silva.
O Fantástico também foi em busca de um tesouro da natureza. Seu Justino, sertanejo autêntico, nos levou a um lugar desconhecido, a que só os nativos da região têm acesso. Encontramos água corrente, em uma das áreas mais secas do Nordeste. O riacho com apenas 1 quilômetro de extensão, irriga a floresta. E tranforma a vegetação seca em um jardim.
As araras vermelhas namoram tranquilas no topo da árvore. A águia chilena também escolheu esse oásis para viver. Os roedores estão por toda parte.
"Esses lugares acabam funcionando como refúgio para fauna. Acabam que eles evitam de transitar na zona periférica e zonas urbanas e serem caçados por caçadores na região urbana”, explica a bióloga Melissa Gogliath.
Mas seu Justino quis levar o Fantástico à origem da água da região. Ao lado de paredões milenares de arenito, onde as araras fazem seus ninhos, uma única nascente, com água perene. Em pelo menos quatro municípios do sul do Piauí, só existe uma nascente, que permanece o tempo todo com água. Atualmente está barrenta, por causa da chuva dos últimos dias. Mas é água potável, na maior parte do tempo, beneficiando centenas de famílias.
Nos piores momentos da seca, a nascente era a salvação. Sem essa água, não havia condições de sobrevivência.
“Não sobrevivia não. O gado, a criação, vinha beber toda aqui. Em 1932, minha mãe já contava que pegavam água aqui direto”, diz o agricultor Justino Pereira de Aquino.
Menos de 1% da água do planeta é potável, própria para o consumo humano. E 97% estão nos oceanos. E a solução é cuidar bem dos mananciais que nos restam, como a nascente do sertão do Piauí.
G1
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