A reportagem é de Carlos Carabaña, publicada pelo jornal El País, 01-11-2014.
Paralelamente, a rede se multiplicava nas casas, nos centros de trabalho, nos telefones celulares. E com ela apareceram tanto sua capacidade de ser a memória supletiva do ser humano informado como a perdição deste, com a proliferação de milhares de páginas cheias de bobagens. Esse segundo aspecto, considerado negativo, é o que um moderno professor de barba comprida, chamado Kenneth Goldsmith, transformou em curso na Universidade da Pensilvânia.
Com o título descritivo de "Perder tempo na internet", essa matéria de redação criativa propõe justamente o que promete. "Passamos nossas vidas diante das telas, na maior parte perdendo tempo: verificando as redes sociais, vendo vídeos de gatinhos, batendo papo ou navegando sem rumo", explica a descrição do curso que começará na próxima primavera. "O que aconteceria se essas atividades (enviar mensagens, atualizar nosso estado e navegar sem rumo) fossem usadas como matéria-prima para criar peças de literatura convincentes e emotivas?"
Em várias entrevistas, Goldsmith declarou que teve a inspiração para o curso depois de ler artigos de imprensa em que se criminalizava o uso excessivo da internet porque desviava demais a atenção, com o risco de transformar o ser humano em um bobo. "Creio que é uma completa mentira que nos torne idiotas, parece-me que a internet nos faz ser mais espertos, que está sendo construída uma nova moral em torno da culpa e da vergonha na era digital."
O plano de estudos, de três horas semanais, exigirá que os alunos estejam diante da tela, interagindo em bate-papos, com robôs agregadores, redes sociais e listas de servidores, com os celulares e uma conexão Wi-Fi como únicos materiais. Na página do curso se explica que os alunos deverão se enfocar na "recuperação alquímica" do navegar sem destino para trabalhos substanciais de literatura.
Goldsmith, um poeta em língua inglesa, não é novo nessa reivindicação da rede como forma de arte. Há menos de um ano criou a iniciativa Imprimindo a internet, na qual imprimiu 250 mil documentos protegidos da biblioteca digital JSTOR. Uma demonstração que buscava redimir a figura de Aaron Swartz, um ativista do livre acesso à informação que se suicidou ao enfrentar uma possível multa de US$ 1 milhão e 35 anos de prisão. Seu crime foi piratear e disponibilizar na Internet esses mesmos textos.
O fato de parecer um professor pouco convencional também não o pega de surpresa. Na revista "ThinkProgress", explica que durante dez anos deu um curso chamado "Escrita não criativa", no qual insta os alunos a copiar e plagiar outros escritores, penalizando a originalidade. Em sua nova cadeira, considera obrigatórias "a distração, a multifunção e o vagar sem rumo". Basicamente conseguir que seus alunos cheguem a procrastinar em nível universitário.
Pode ser até que consiga juntar seus dois cursos. Uma novela com a estrutura do Facebook, um poema escrito na internet ou no Twitter como meio de expressão de uma suposta arte. Na realidade, é qualquer coisa menos algo novo.
Fonte: IHU Online
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