domingo, julho 27, 2014

Desastres naturais arrasarão os benefícios do desenvolvimento

Será impossível acabar com a pobreza extrema e a fome com o rápido aquecimento do planeta, repleto de secas, inundações catastróficas e um clima cada vez mais instável, segundo ativistas que participaram das negociações dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou, no dia 19, o rascunho dos 17 ODS após um ano e meio de discussão entre mais de 60 países participantes no processo voluntário.

Os ODS são um conjunto de metas e objetivos destinados a eliminar a pobreza extrema e conseguir o desenvolvimento sustentável. Quando estiverem definidos em 2015, ao término dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), os ODS se converterão no itinerário a ser seguido pelos países para elaborarem suas políticas e decisões ambientais e socioeconômicas.

“Os desastres naturais são um motivo importante do descumprimento de muitas das metas dos ODM”, afirmou Singh Harjeet, coordenador internacional de mitigação de riscos de desastres na ActionAid International, uma organização de desenvolvimento internacional com sede em Johannesburgo. “Uma inundação grande ou um tufão podem atrasar o desenvolvimento de uma região em 20 anos”, apontou. Os tufões são ciclones tropicais caracterizados por ventos superiores a 118 quilômetros por hora.

Singh recordou que o tufão Haiyan matou mais de seis mil pessoas e deixou quase dois milhões de vítimas nas Filipinas em novembro de 2013. Menos de um ano antes, em dezembro de 2012, o país sofreu com a passagem do tufão Bopha, que causou mais de mil mortes e cerca de US$ 350 milhões em danos. Nas duas últimas semanas dois tufões atingiram esse país, que pode sofrer mais 20 tormentas antes de terminar a temporada desses fenômenos climáticos em outubro.

“Os desastres naturais repercutem em tudo: na segurança alimentar, saúde, educação, infraestrutura, etc. Você não pode sair da pobreza se precisa reconstruir sua casa a cada dois anos”, afirmou Singh. Os objetivos de eliminação da pobreza ou quase qualquer coisa proposta pelos ODS “não têm sentido sem a redução das emissões de carbono”, assegurou.

As emissões de carbono produzidas pela queima de petróleo, carvão e gás prendem o calor do sol. Esta energia calórica adicional equivale à explosão diária de 400 mil bombas atômicas, semelhantes à que destruiu a cidade japonesa de Hiroxima em 1945, nos 365 dias do ano, segundo James Hansen, especialista em clima e ex-diretor do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da Administração Nacional da Aeronáutica e do Espaço (Nasa), dos Estados Unidos. Em consequência, agora o planeta está 0,8 grau mais quente.

“A mudança climática repercute em todos os fenômenos meteorológicos porque o entorno em que ocorrem está mais quente e úmido do que costumava ser”, explicou à IPS Kevin Trenberth, especialista em fenômenos extremos e cientista do Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica, dos Estados Unidos. A mudança climática não necessariamente provoca os desastres naturais, mas não há dúvidas de que os agrava, afirmou.

Os ODS devem incorporar questões do clima e vias para o desenvolvimento baixo em emissão de carbono, disse Bernadette Fischler, copresidente da britânica Beyond 2015, uma aliança de mais de mil organizações da sociedade civil que trabalham pela solidez e eficácia dos ODS. “A mudança climática é um problema urgente e tem de estar muito visível nos ODS”, opinou à IPS.

No rascunho atual dos ODS, o clima é o objetivo 13, que pede aos países que “adotem medidas urgentes para combater a mudança climática e suas consequências”. Não há metas de redução das emissões, e em sua maioria se referem apenas à adaptação frente aos próximos fenômenos do clima. “Os países não querem adiantar suas posições nas negociações da ONU sobre mudança climática”, pontuou Lina Dabbagh da Climate Action Network, uma rede mundial de organizações ambientalistas.

A Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC) habilita a negociação para adotar um novo tratado sobre o clima mundial em 2015. Após cinco anos de conversações, não houve progressos em temas fundamentais. “Os ODS são uma grande oportunidade para avançar no clima, mas o objetivo climático é débil e não há um programa de ação”, apontou Dabbagh à IPS.

A redação final do rascunho dos ODS foi um processo extremamente politizado, o que gerou um texto muito cauteloso. As alianças e divisões entre os países foram muito semelhantes às existentes nas negociações da CMNUCC, incluída a divisão entre o Sul em desenvolvimento e o Norte industrial, destacou Dabbagh. Segundo Fischler, os governos estão preocupados com a mudança climática e suas consequências, mas existe uma forte discordância sobre com refleti-lo nos ODS, e alguns pretendem que sejam mencionados apenas no preâmbulo do projeto final.

Países como a Grã-Bretanha acreditam que 17 objetivos são muitos e é possível que alguns sejam eliminados no último ano das negociações, que começarão quando os ODS forem apresentados formalmente à Assembleia Geral da ONU, no dia 24 de setembro. Um dia antes, o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, organizará uma cúpula climática com os chefes de governo de muitos países, com a intenção de colocar em andamento o processo para um ambicioso tratado internacional sobre o clima no próximo ano.

“A sociedade civil pressionará fortemente durante a cúpula para que o clima seja uma parte integral dos ODS”, afirmou Dabbagh. Porém, acrescentou, resta muito a ser feito para que os responsáveis políticos e as pessoas compreendam que a ação climática é a chave para eliminar a pobreza extrema e alcançar o desenvolvimento sustentável.

Fonte: IPS em Envolverde

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