Segundo a revista “Veja”, um perfil apócrifo no Facebook dizia que o ministro “morreria de câncer ou com um tiro na cabeça”
— Não se surpreendam se eu largar o Supremo antes das eleições — avisou Barbosa numa dessas conversas, informando que voltaria a dar aulas e a fazer palestras.
Antes do julgamento do mensalão, o ministro frequentava restaurantes e bares em Brasília e no Rio. E continuou a fazê-lo por algum tempo. Tudo mudou nos últimos meses, especialmente após a prisão de mensaleiros. Com a profusão de ameaças nas redes sociais, e o episódio em que foi abordado por um grupo de militantes do PT, ao deixar um restaurante em Brasília, Barbosa se sentiu forçado a mudar seus hábitos.
— Ele passou a evitar locais públicos por medo em relação à sua segurança. Parou de sair — disse um amigo de Barbosa: — Agora, ele está se sentindo aliviado. Ele estava cansado, quer viver a vida. Estava muito patrulhado, se sentia agredido com palavras, com provocações. Me disse: “Tô precisando viver”.
Segundo a revista “Veja”, um perfil apócrifo no Facebook dizia que o ministro “morreria de câncer ou com um tiro na cabeça” e que seus algozes seriam “seus senhores do novo engenho, seu capitão do mato”. Outro perfil dizia: “Contra Joaquim Barbosa toda violência é permitida, porque não se trata de um ser humano, mas de um monstro e de uma aberração moral das mais pavorosas. Joaquim Barbosa deve ser morto”. A Polícia Federal investiga a origem das ameaças.
— Esse fator (as ameaças) contribuiu para sua saída antecipada — disse outro interlocutor do ministro.
Barbosa acordou ontem decidido e, de manhã , foi dar a notícia à presidente Dilma Rousseff, que ficou surpresa. Depois, despediu-se oficialmente dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Como Ilimar Franco contou em seu blog, Barbosa disse a Henrique Alves que não pretende seguir carreira política.
— Política, de jeito nenhum! — afirmou o presidente do STF.
Descontraído, ainda falou sobre o seu futuro.
— Vou fazer como o Lula, vou dar palestras — disse Barbosa.
Após esses encontros, Barbosa anunciou sua aposentadoria precoce no início da sessão de ontem do Supremo.
— Tenho uma informação de ordem pessoal a trazer: decidi me afastar do STF no final de junho. Afasto-me não apenas da presidência, mas do cargo de ministro. Requererei o meu afastamento do serviço público após quase 41 anos. Tive a felicidade, a satisfação e a alegria de compor esta Corte no que é, talvez, o seu momento mais fecundo, de maior criatividade e de importância no cenário político institucional do nosso país. Sinto-me deveras honrado de ter feito parte deste colegiado e de ter convivido com diversas composições e, evidentemente, com a atual composição do STF. Agradeço a todos, meu muito obrigado — afirmou.
Barbosa ficou popular com o julgamento do mensalão, a ponto de ser bem avaliado nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República. No entanto, os eleitores não poderão ver seu nome nas urnas em outubro. Além de sua disposição de não concorrer, o prazo de desincompatibilização de juízes com os cargos que ocupam venceu em 4 abril. Quem não fez isso a tempo não pode se candidatar.
— Ele teria que ter se desincompatibilizado até 4 de abril. Parece que o cavalo passou encilhado e ele não colocou o pé no estribo. Não dá mais. Agora, ele está inelegível — explicou o ministro Marco Aurélio Mello.
Amadurecida ao longo dos últimos anos, a ideia de deixar o Supremo começou a tomar forma concreta em janeiro, durante viagem à França e à Inglaterra, onde deu palestras e participou de eventos representando o STF.
— Essa decisão (tomei) naqueles 22 dias que tirei em janeiro, estive na Grã-Bretanha e na França. Aquilo foi decisivo para minha decisão — explicou.
Nos últimos dias, Barbosa procurou ao menos três ministros para contar a novidade — entre eles, Luiz Fux, o integrante do Supremo com quem tem maior proximidade. Os outros não sabiam de nada. Marco Aurélio está no grupo dos surpreendidos.
— Não sabíamos de nada. Pelo menos, eu não tinha conhecimento de que ele deixaria o tribunal. Pega de surpresa o Supremo, pelo menos um dos integrantes, que sou eu — afirmou.
Com a saída do relator do mensalão, o processo será conduzido por outro ministro, a ser sorteado para a função assim que Barbosa deixar a Corte oficialmente. Esse ministro ficará responsável pela execução das penas dos 24 condenados. E tomará decisões referentes ao direito ao trabalho externo de presos no regime semiaberto — benefício que Barbosa negou recentemente a oito condenados, incluindo o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.
Fonte: Jornal O Globo
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