Essa foi uma das principais conclusões do debate sobre reconhecimento e direitos humanos, no segundo dia do Fórum Mundial dos Direitos Humanos, em Brasília
A constatação permeou as falas do debate “Reconhecimento e Direitos Humanos”, que aconteceu no segundo dia do Fórum Mundial de Direitos Humanos, que contou com Ahmed Harzenni, militante marroquino de esquerda e dos direitos humanos, além de Tonico Benites, liderança Guarani-Kayowá, e a professora Ela Wiecko, jurista e membro do Ministério Público, além da coordenação de Salete Valesan, da Faculdade Latino Americana de Ciências Sociais, e da relatoria de Sandra Nascimento, do Laboratório de Estudos em Políticas Indigenistas da UNB.
Também vindo da área do Direito, Ahmed Harzenni defendeu a necessidade de as constituições serem mais precisas no que diz respeito aos marcos dos direitos humanos. Para ele, é preciso mais detalhamento para que se possa atuar na defesa desses direitos. Mesmo reconhecendo a importância da política institucional, o marroquino afirmou que, para ele, o Parlamento, ainda que seja o centro da democracia no mundo, não dá conta de efetivar os direitos humanos. Por isso mesmo, ele fez coro a uma demanda bastante existente entre os movimentos, o fomento a mais instrumentos de controle e acompanhamento pela sociedade civil.
A fala de Tonico Benites focou nos absurdos por que passam as comunidade indígenas no Brasil, em especial na questão que, por mais candente que seja atualmente, ainda é de uma visibilidade atroz: os confrontos com fazendeiros nas disputas por terras.
Tonico explicou que os índios, há mais de 400 anos, não eram considerados humanos, e que ainda dói nele isso até hoje. Depois de um período, foram considerados sub-humanos, mas apenas com a Constituição Federal de 1988 os índios alcançaram o reconhecimento de que são seres humanos.
Porém, segundo Tonico, está claro que os direitos humanos não são aplicados aos indígenas. Ele trouxe um vídeo, feito por ele mesmo, que era uma colagem de diversas reportagens televisivas, ilustrando os confrontos e como os índios foram sendo sistematicamente expulsos de suas terras por fazendeiros, em geral com apoio, de maneira absolutamente ilegal, até do poder público.
O Guarani-Kayowá afirmou então que a situação hoje continua exatamente a mesma. Ele contou que no dia anterior ao debate, o dia de abertura do Fórum Mundial de Direito Humanos e que se celebrou os 65 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, mais uma liderança indígena foi assassinada pelas forças paramilitares dos fazendeiros.
A fala da professora Ela combinou perfeitamente com o que Tonico diria em seguida. Isso porque ela afirmou que, mesmo dentro dos marcos do reconhecimento dos direitos humanos, não se reconhecem os direitos culturais. Para ela, é uma batalha duplamente difícil o reconhecimento dos direitos culturais dos povos e grupos subalternos – e ela reafirmou o uso do termo subalterno em detrimento do mais comumente usado, vulneráveis.
Ela afirmou que essa dimensão cultural está escondida, e muitas vezes é posta em confronto com outros direitos considerados dentro do bojo dos direitos humanos. Ela exemplificou isso usando a sentença do juiz de Altamira, que afirmou que não se poderia colocar os direitos dos indígenas que ali estavam acima do direito humano de desenvolvimento do país.
Para ela, a não reconhecimento dos direitos culturais se relaciona a uma visão eurocêntrica de mundo e a um conceito que ela nomeou de colonialidade, diferente de colonialismo. Para ela, a colonialidade naturaliza a inferiorização de certos povos, tanto na esfera epistêmica quanto na ontológica.
O Fórum Mundial de Direitos Humanos prossegue até sexta-feira, dia 13, e já conta com mais de seis mil inscritos, em Brasília.
Reportagem de Rodrigo Mendes na Carta Maior em 11/12/13.
Créditos da foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
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