terça-feira, junho 11, 2013

A alma da juventude da era 'touch'

"Será que uma educação que leve o caos em consideração, que opere mais por montagem do que por justaposição e por um mosaico de estímulos - misturar física com linguística com literatura com história com matemática, em espaços amplos e criativos, com burocracia mínima e sem as famosas "notas" -, teria penetração e eficácia maior com a juventude atual, que carrega o tempo no polegar?" escreve Noemi Jaffe, escritora, em artigo publicado no jornal Valor, 07-06-2013.

Eis o artigo.

Apesar do nome infeliz - Polegarzinha - e do fato de o livro ser a reprodução de um discurso feito por Michel Serres na Academia Francesa em 2011, o que o torna bem mais superficial do que poderia, esse livro com cara de autoajuda supera as expectativas. Polegarzinha é o nome que o autor criou para definir a nova geração de jovens, para quem o conhecimento, a intuição e o prazer estão todos concentrados no toque do polegar - GPS, celular, iPads, controles remotos, mensagens. E a palavra está no feminino - polegarzinhA e não polegarzinhO - porque, ao longo de sua experiência letiva de mais de 30 anos na Universidade de Stanford, no Estado da Califórnia, nos EUA, constatou que as garotas são muito mais diligentes, criativas e - aguentem, rapazes - inteligentes do que os garotos.



A tese inesperada - mas convincente - do filósofo é que as coisas não estão tão ruins quanto apregoam pensadores importantes da esquerda e da direita e adultos em geral. As novas gerações, que aparentam dependência total dos "gadgets" eletrônicos e consequente alienação de um saber aprofundado, personalizado e processual, estariam, na verdade, segundo a opinião de Serres, construindo uma outra forma - múltipla, rápida, intuitiva e criativa - de conhecimento.

Os jovens atuais não teriam o mesmo corpo que nós - ex-jovens. Outra expectativa de vida, outras formas de comunicação, outra percepção da natureza; nascidos com peridural e data programada, não temem a mesma morte, não falam a mesma língua.

São a geração literalmente "maintenant" (em francês, "agora"), porque "tenant" ("seguram") o tempo com a "main" ("mão"). São mais físicos, concretos e não dão tanta importância para os nossos conceitos abstratos, embora, segundo o autor, cheguem aos mesmos lugares e conclusões por vias narrativas e simbólicas. Não vivem com a tecnologia, mas na tecnologia e, portanto, para eles nossos dilemas existenciais com as máquinas nem representam um problema.

No livro, o autor também detecta problemas educacionais e sociais relacionados a uma teimosia conservadora em manter as instituições ainda presas a um modelo "escrito", centrado na página e na abstração e propõe formas mais caóticas de aprendizado e estruturação social.

Será que uma educação que leve o caos em consideração, que opere mais por montagem do que por justaposição e por um mosaico de estímulos - misturar física com linguística com literatura com história com matemática, em espaços amplos e criativos, com burocracia mínima e sem as famosas "notas" -, teria penetração e eficácia maior com a juventude atual, que carrega o tempo no polegar?

Penso que sim. Penso que a educação, de forma lenta, precisa caminhar globalmente nessa direção, se quisermos que os jovens aliem, à obrigação de ir à escola, também o desejo de frequentá-la. Não se trata de seduzi-los, tentando artificialmente falar sua língua. Trata-se de, também nós, processarmos nossos saberes sob abordagens mais poéticas, maleáveis e descentradas. De ampliarmos a ideia de rigor científico e comportamental para horizontes mais físicos e móveis.

Como fazer isso? Ainda não sabemos e é preciso suportar esse não saber e caminhar com ele em nosso cotidiano, sem disfarçá-lo ou ocultá-lo, o que é ainda pior. Muitas escolas estão - justamente em função da dificuldade cada vez maior dos alunos em se concentrar apostando no caminho oposto: mais rigidez, mais regras e burocracia.

Tenho a impressão de que essa atitude é equivalente a martelar mensagens em tabletes de pedra, depois da invenção da prensa. A tecnologia é um meio e se a recusarmos como meio ela, ao menos para nós, se transformará num fim. Algo a ser temido, não utilizado. E aí sim não haverá mais como contornar o problema.

Fonte: IHU - Instituto Humanitas Unisinos

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