Assis Ramalho entrevista Roberto Cabrini (Fotos: Leopoldo Cavalcante Leal) |
Na segunda-feira (16), a reportagem do Blog de Assis Ramalho entrevistou, com exclusividade, o repórter Roberto Cabrini, comandante do Conexão Repórter do SBT. O competente jornalista já foi correspondente internacional da Rede Globo em Londres e Nova York, ganhou os principais prêmios como repórter investigativo (Esso, APCA, Líbero Badaró, Imprensa, Tim Lopes e Vladimir Herzog) e cobriu seis guerras. Cabrini afirmou que sua estadia em Petrolândia, no Sertão de Pernambuco, deve-se a reportagem investigativa sobre trabalhadores que saem do sertão e vão se aventurar no Sul e Sudeste do Brasil.
Na entrevista, o consagrado repórter, especialista em jornalismo investigativo, fala sobre as coberturas de guerra, e em defesa dos direitos humanos, além de comentar detalhes de sua brilhante carreira. Entre outros assuntos, Roberto Cabrini fala com exclusividade sobre um dos maiores furos de reportagens da história do país, que foi a sua entrevista exclusiva com Paulo César Farias, o PC.
Em outubro de 1993, após sete meses de investigação, Roberto Cabrini descobriu o paradeiro do fugitivo da justiça, Paulo César Farias, em Londres, driblando até mesmo as buscas da polícia brasileira. PC Farias foi tesoureiro de campanha de Fernando Collor de Mello nas eleições presidenciais brasileiras de 1989. Cabrini foi a personalidade chave, que causou o primeiro processo de impeachment da América Latina, em 1992.
No comando do Conexão Repórter, Cabrini e sua equipe ganharam o mais importante Prêmio de reportagens do Brasil, o Prêmio Esso de 2010 de telejornalismo. A reportagem "Sexo, intrigas e poder" investigou casos, antes ocultos, de pedofilia dentro da Igreja Católica, em Arapiraca, no Sertão de Alagoas, e levou três sacerdotes, incluindo um importante Monsenhor, a julgamento. A reportagem repercutiu em todo mundo e fez com que, pela primeira vez, o Vaticano reconhecesse a existência de casos de abusos sexuais na igreja católica no Brasil. O monsenhor Luiz Marques foi condenado a 21 anos de reclusão. Já o padre Edilson Duarte e o monsenhor Raimundo Gomes foram sentenciados a dezesseis anos e quatro meses. O trabalho jornalístico de Roberto Cabrini e sua equipe foi considerado fundamental pelo ministério público para a condenação histórica dos sacerdotes católicos, fato inédito no Brasil.
Na entrevista ao Blog de Assis Ramalho, Roberto Cabrini afirma que a injustiça é algo que toca o seu coração e é para isso que existe o Conexão Repórter, programa jornalístico que combate as injustiças e dá voz aqueles que não tem vez.
Em votação realizada em 2013, Roberto Cabrini voltou a ter seu programa Conexão Repórter escolhido como o melhor programa jornalístico da TV brasileira em 2012, ganhando também o Troféu Internet de melhor jornalístico, na votação popular.
Blog de Assis Ramalho: Agradecemos a atenção dispensada por Roberto Cabrini à nossa reportagem.
Roberto Cabrini: Muito obrigado e até a próxima.
Redação do Blog de Assis Ramalho
Fotos: Leopoldo Leal/Blog de Assis Ramalho
Perguntado pela nossa reportagem se não teme pela vida por realizar reportagens investigativas chocantes e se recebe ameaças, ele diz que ameaças fazem parte da sua profissão, mas que está preparado para tudo isso, pois acredita piamente naquilo que faz, fazendo suas reportagens em homenagem às pessoas que confiam no seu trabalho.
Em 30 anos de carreira, Roberto Cabrini cobriu seis guerras internacionais: Afeganistão, Iraque, Palestina, Camboja, Caxemira e Somália. Participou de cinco Olimpíadas e cinco Copas do Mundo, foi correspondente internacional durante oito anos - quatro deles em Londres e quatro em Nova York - além de realizar coberturas em mais de 60 países.
Em votação realizada em 2013, Roberto Cabrini voltou a ter seu programa Conexão Repórter escolhido como o melhor programa jornalístico da TV brasileira em 2012, ganhando também o Troféu Internet de melhor jornalístico, na votação popular.
Acompanhe abaixo a entrevista com Roberto Cabrini, concedida com exclusividade ao reportagem do Blog de Assis Ramalho:
Blog de Assis Ramalho: Qual o motivo da visita do consagrado repórter à cidade de Petrolândia?
Roberto Cabrini: Em primeiro lugar, eu gostaria de mandar um abraço para o
povo de Petrolândia, porque me impressiona muito o calor humano, a
receptividade, o quanto as pessoas são calorosas e generosas aqui nesta região.
Eu me encontro aqui fazendo uma reportagem investigativa, um grande
levantamento sobre as pessoas que ainda saem desta região e vão para São Paulo,
e lá, muitas vezes, são enganadas, são desrespeitadas, o que é uma pena, já que o
ideal seria que as pessoas fossem valorizadas em qualquer parte do país, que
tivessem possibilidades de arrumar empregos e de sustentarem as suas
famílias em qualquer região da nossa
nação.
Blog de Assis Ramalho: Apesar de toda a sua experiência, ainda chega a se emocionar ao ver o sofrimento dos mais carentes, principalmente aqui no sertão?
Roberto Cabrini: Bom, recentemente eu fiz uma reportagem em Abaré, no sertão
da Bahia, e foi uma reportagem que mostrou muito bem a questão do
coronelismo, onde poucos detêm quase
tudo, enquanto a população, muitas vezes, é renegada a uma situação de segunda categoria. Mostramos escolas sem as menores condições, escolas de taipa, escolas sem
energia elétrica, sem água, sem banheiro, com as crianças sem a menor
possibilidade de ter uma educação decente, animais entrando nas escolas,
profissionais abnegados, que tentam contrariar
todas as más condições, e ainda assim fornecer
uma educação para as crianças. Então, estamos em uma região onde ainda o coronelismo impera. Essa é a verdade e isso precisa ser combatido, porque todos tem o direito do nascer do sol aqui
no Sertão, e a gente sonha com um momento em que o sol vai nascer para todos
aqui no Sertão, e não apenas para meia dúzia de privilegiados, que detêm todas as
condições e mantêm a grande maioria da população, sem o acesso aos serviços mais
básicos.
Blog de Assis Ramalho: As injustiças sociais lhe fazem emocionar-se? Qual a importância do Conexão Repórter nestas matérias chocantes?
Roberto Cabrini: Me emociona, porque
a injustiça é algo que toca o meu coração e é para isso que existe o Conexão
Repórter. O Conexão Repórter é um
programa jornalístico que combate as injustiças, que dá voz aqueles que não tem
vez. Enfim, direitos humanos é algo que toca profundamente toda a equipe do
Conexão Repórter e a gente procura, através da informação, através da
conscientização da população, gerar reflexão. E com a reflexão, a população
consegue decidir melhor os seus caminhos.
Blog de Assis Ramalho: Entre as inúmeras reportagens marcantes em sua carreira, aquela realizada em Londres, com Paulo César Farias (o PC Farias), foi a que mais marcou a sua carreira?
Roberto Cabrini: Olha, eu sempre digo que a principal matéria é sempre a
próxima e é assim que eu ajo. A cada
missão eu sei que tenho que fazer sempre o melhor, porque eu sei que existem pessoas que dependem de uma informação, muitas vezes corajosa e
ousada, para poder fazer a justiça. Sobre
as minhas matérias que marcaram mais, você citou aí a do PC Farias. Teve a
matéria da localização da Jorgina (de Freiras), realizei várias coberturas de guerras. Eu cobri seis
guerras. Também fiz coberturas de Copa do Mundo, cobertura de Olimpíadas e, agora, no Conexão
Repórter, a gente já ganhou vários prêmios. Ganhamos o Prêmio Esso com uma
matéria que revelou a pedofilia dos padres contra coroinhas em Arapiraca. Enfim, todos os dias a gente sai a campo, tentando fazer com que as pessoas que
não têm acesso à justiça social, possam melhorar suas situações e é isso que
nos inspira.
Blog de Assis Ramalho: Você já temeu pela sua vida? Já chegou a receber ameaças por realizar matérias investigativas bombásticas que, na maioria das vezes, vão de encontro aos "poderosos".
Roberto Cabrini: Ameaças fazem parte da minha profissão, porque os
denunciados não mandam flores. Eles ameaçam, perseguem, processam e, muitas
vezes, tentam ferir as pessoas que você mais ama. Mas eu estou preparado para
tudo isso e acredito piamente naquilo que eu faço, e é em homenagem às pessoas
que confiam no meu trabalho, que todos os dias mandam perguntas, mandam
informações, que geram grandes reportagens. É homenageando essas pessoas, que
se sentem injustiçadas, que todos os dias
eu saio ao campo.
Blog de Assis Ramalho: O jornalismo investigativo e corajoso realizado por você está em extinção na TV brasileira? O que observamos, com algumas exceções, é um jornalismo superficial e sem conteúdo.
Roberto Cabrini: De fato, não faltam exemplos de jornalismo superficial,
raso, tendencioso e unilateral. É por isso que se convencionou (classificar) o jornalismo
investigativo, que é aquele que vai mais além, aquele que vence, justamente,
essas tendências de um mau jornalismo. E o que é um jornalismo investigativo? É
aquele que se aprofunda nas investigações e que permite que todos os ângulos
envolvidos em uma informação sejam ouvidos. Todos eles precisam ser ouvidos.
Como disse o Voltaire: "Não concordo com nenhuma palavra do que dizes, mas
defenderei à morte teu o direito de dizê-las". O contraditório faz parte da
nossa obrigação. Eu não diria que sou o único, porque existem muitos
jornalistas, muitos exemplos de jornalismo bem feito. Possivelmente, o país
precisaria de mais jornalismo investigativo, de mais jornalismo corajoso. Mas
eu tenho visto grandes exemplos, em vários veículos de comunicação, e eu não
estou só. Isso eu posso lhe garantir.
Blog de Assis Ramalho: Qual conselho e orientação você daria para quem pretende seguir a carreira do jornalismo?
Roberto Cabrini: Vocês estão abraçando um profissão extremamente nobre, mas
também difícil e desafiadora. Um jornalista é aquele que tem coragem com responsabilidade, porque depende-se do
trabalho desse profissional para que o país tenha um pouco mais de justiça, (país) em que o povo tanto reclama pela aviltante distribuição de renda, pela aviltante segregação social que nós assistimos,
onde tantos brasileiros não têm acesso aos bens mais básicos. E essas pessoas
dependem, muitas vezes, de um jornalismo corajoso, de um jornalismo que não se
acomode e que não seja serviçal das classes dominantes. Dito isso, precisamos fazer tudo com extremo
rigor, com muita responsabilidade, e nada justifica um jornalismo raso, mal
feito e com acusações levianas. O jornalismo precisa de profissionais que
possam unir essas duas vertentes, que são ousadia e responsabilidade.
Blog de Assis Ramalho: Qual o segredo foi utilizado para encontrar Paulo César Farias em Londres, já que nem a Polícia Federal tinha conseguido.
Roberto Cabrini: Bem, se eu for contar a história inteira, a gente não sai daqui
hoje. Mas foi, basicamente, ouvindo várias fontes. Todo ser humano quando foge,
mais cedo ou mais tarde, ele volta a recorrer a antigas estruturas, a pessoas
que cuidavam dele, em algum ponto da vida dele. Fugir demanda tempo e muito
dinheiro, é muito caro. Mais cedo ou mais tarde, ele volta para os antigos
hábitos e com PC foi assim também. Ele voltou a procurar antigas estruturas e, através disso, com um bom trabalho, nós conseguimos chegar até ele. Ao contrário
de muitos policiais, eu fui atrás dele. Tinha policiais que recebiam dinheiro
para não localizá-lo.
Blog de Assis Ramalho: Você tinha alguma relação de amizade com Paulo César Farias?
Roberto Cabrini: Amizade não, digamos que eu tinha com PC uma boa relação. Ele
era uma pessoa educada, mas é evidente que um profissional não pode concordar
com o que ele fazia. Ele cometia atos ilegais. Porém, era uma pessoa simpática,
uma pessoa falante.
Blog de Assis Ramalho: A entrevista com PC foi o trabalho mais perigoso da sua carreira? Não sentiu medo de realizá-la?
Roberto Cabrini: Eu não sei se foi o trabalho mais perigoso, porque quando
eu estou dentro de uma missão eu me concentro de tal forma que não sinto medo.
Eu aprendi a controlar o meu medo pelo meu próprio trabalho. Eu estou de tal
forma concentrado na missão, que eu afasto esses sentimentos. Eu acho que ele (o
medo) só aparece na minha mente depois que eu termino. Mas, naquele instante,
eu fico totalmente concentrado, obcecado em fazer algo que a sociedade precisa
que eu faça. Então o meu medo é um medo controlado. O medo é bem-vindo, porque ele mostra as suas limitações, mas ele passa a ser um problema se começa a te paralisar, a te engessar. E, graças a Deus, eu já identifiquei, cobrindo
guerras, passando por muitas situações
difíceis e de ameaças. O medo não me paralisa.
Blog de Assis Ramalho: Você acha que já chegou ao auge, ao topo de sua carreira?
Roberto Cabrini: Não, eu sempre tenho motivação pela próxima matéria. Eu vejo
a profissão com muita humildade e como um sacerdócio também. É uma missão em que existe uma população que espera que eu faça um grande trabalho. Portanto, é uma
responsabilidade muito grande, e eu procuro atender a essa expectativa das pessoas.
Roberto Cabrini: Muito obrigado e até a próxima.
Redação do Blog de Assis Ramalho
Fotos: Leopoldo Leal/Blog de Assis Ramalho
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