Fotos: Assis Ramalho |
Nesse domingo (23), foi concluído o II Seminário dos Povos Indígenas da Bacia do Rio São Francisco, com a elaboração do documento final do evento,
promovido pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco – CBHSF, com o apoio da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – Apoinme.
O evento foi realizado no Hotel Pontal do Lago, localizado às margens do reservatório da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga (antes denominada Usina de Itaparica), diante das serras onde vivem os índios Pankararu, que no final da década de 1980 tiveram as terras inundadas pelas águas do reservatório da Chesf. Reuniram-se Lideranças de etnias de Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais discutem questões de interesse comum, a exemplo de políticas públicas, direito ambiental, demarcação de terras, impactos das barragens sobre o rio, perspectiva de implantação de usinas nucleares na bacia e implantação de projetos de recuperação hidroambiental.
No documento final do Seminário, foram pontuadas pelos indígenas as questões de acesso à água e ficou acertado, junto ao CBHSF, a regularização da água encanada em todo o território pankararu. No documento de denúncia a organismos internacionais, o governo brasileiro é denunciado pelo desrespeito aos direitos indígenas, como na portaria 303 da AGU que versa sobre território indígena e da proposta da PEC 215 que tira do Executivo a responsabililidade pela demarcação de terras indígenas e transfere para o Legislativo. Esse documento será encaminhado, via setor jurídico do Cômite das Bacias Hidrograficas do São Francisco - CBHSF, aos órgãos internacionais, como ONU e OEA. Também foi registrado o repúdio à construção de usinas nucleares no rio São Francisco e a reivindicação do acesso à água por todas comunidades indígenas ribeirinhas do rio São Francisco.
No final do evento, que teve a participação de cerca de 20 etnias indígenas dos estados de Minas Gerais, Alagoas, Pernambuco e Bahia, foi decidido que o 3º Seminário dos Povos Indígenas da Bacia do rio Sao Francisco será realizado no município de Carmesia (MG), território do povo Pataxó, em 2013.
O evento foi uma realização do CBHSF com apoio da APOINME e organização da secretaria de assuntos indigenas de Petrolândia e teve a condução de José Maciel Nunes, Secretário Executivo do CBHSF, Dra. Ana Cacilda, Coordenadora do CGLIC Funai Brasilia, Clênio Eduardo da Silva, técnico indigenista Funai, Marcos Sabaru, coordenador da APIB - Articulação dos Povos Indígenas do Brasil e Adelmar Júnior, Secretário de Assuntos Indígenas de Petrolândia.
O evento teve início no sábado (22), com a dança ritual do Toré. Na sequência, homens e mulheres, jovens, adultos e idosos acompanham palestras e participam das discussões
O representante da Fundação Nacional do Índio – Funai, Clênio Eduardo da Silva, falou aos participantes sobre Direito Ambiental, explicando a lógica que norteia esse direito: fazer uso dos recursos naturais hoje, de maneira a garantir a sua permanência no futuro. Esclareceu ainda sobre o princípio do poluidor-pagador, que obriga à reparação e à prevenção dos danos ambientais, e sobre o princípio da participação, que possibilita à sociedade influenciar nas decisões e politicas públicas relativas ao meio ambiente.
Na ocasião, foi apresentado o projeto Gestão Ambiental e Territorial Indígena-Gati, desenvolvido pelo movimento indígena, Funai e Ministério do Meio Ambiente, com o apoio de organismos internacionais, para promover a recuperação de áreas degradadas e incentivar boas práticas agroecológicas. Dentre as 32 terras indígenas onde o projeto está sendo implantado, se incluem duas na bacia do São Francisco, os territórios dos Xocós, em Sergipe e Alagoas, e dos Pankararu, em Pernambuco.
A situação dos Pankararu
Durante a palestra da Funai, os participantes chamaram a atenção para a situação do povo Pankararu, quase 8 mil indígenas que vivem em frente ao rio São Francisco e não têm acesso a água. O pankararu Marcelo Gomes Monteiro Luz denunciou que “a gente não tem acesso a esse rio, que é um patrimônio público, nosso”, e afirmou, relativamente a direitos e deveres, que “para nós é um direito o acesso à água”.
O líder indígena Marcos Sabaru, do povo Tingui-Botó, de Alagoas, membro titular do Comitê do São Francisco e um dos organizadores do encontro, pediu um posicionamento sobre o que considera ser um dever do Estado brasileiro: “É injusto a comunidade sair e hoje estar sem água, sem acesso ao rio. A pergunta é: o que é que se pode fazer?”, indagou.
Adelmar Fernandes Barbosa Junior, titular da Secretaria de Assuntos Indígenas da prefeitura de Petrolândia, e também organizador do encontro, considerou “vergonhosa” a situação do seu povo, que historicamente vivia às margens do rio e agora não tem acesso às margens nem às águas: “A obra da transposição tira água do rio São Francisco para levar para o Ceará e nós aqui estamos sujeitos a viver de carro-pipa”.
Edvaldo Gomes da Silva, o “Zoinho”, denunciou que um sistema adutor destinado a abastecer a população do município passa pelo território pankararu, sem que nenhum ramal tenha sido criado para abastecer o povo indígena. “É um absurdo que esses canos passem por nossas terras e a gente não tenha água. Por isso declaramos que estamos na luta para ter acesso à agua”.
O secretário executivo do Comitê do São Francisco, José Maciel Nunes de Oliveira, considerou que “é uma falta de respeito que esse povo não tenha acesso a água, sabendo-se que as poucas nascentes, com a estiagem que estamos enfrentando, não oferecem condições de abastecimento”. Ele informou que o Comitê já se dirigiu formalmente aos órgãos públicos envolvidos na construção do sistema de abastecimento de água na área, solicitando providências imediatas para atendimento ao povo pankararu.
Usinas nucleares
A perspectiva de implantação de usinas nucleares na bacia do São Francisco foi outro assunto dominante nos debates. O geógrafo Vinícius Gomes de Souza, que pesquisou os impactos do reservatório de Itaparica, abordou o assunto durante o questionamento que fez sobre o impacto das grandes obras sobre os povos indígenas.
Cícera Leal Cabral, do povo Pankará, denunciou que uma rodovia está sendo construída no município de Itacuruba (PE), em direção à fazenda Jatinã, local cogitado para a construção de uma usina nuclear. A rodovia atravessa a terra dos pankará, que fica próxima a Jatinã. A população local, inclusive os indígenas, realizou este ano uma manifestação de protesto contra a implantação de uma usina nuclear no município, devido aos riscos ambientais.
O evento foi realizado pelo CBHSF (Fundo do Comitê da Bacia Hidrográfica
do rio São Francisco), com apoio da AGB Peixe Vivo (Associação Executiva
de Apoio a Gestão de Bacias Hidrográficas Peixe Vivo) e Apoinme
(Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais
e Espírito Santo), em parceria com a Secretaria de Assuntos Indígenas
de Petrolândia.
Para ver o álbum com todas as fotos do evento, clique no atalho abaixo:
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Da redação do Blog de Assis Ramalho
Fotos: Assis Ramalho
Com informações do CBHSF e Secretaria de Assuntos Indígenas de Petrolândia
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